O blues pode
ser comparado a um grande útero musical em constante trabalho de parto gerando filhos
bacanas como a Power Blues. A banda que está na luta a vários anos abriu um
espaço na agenda e nos concedeu esta entrevista para contar um pouco da sua
história. Leiam e divulguem!!
2112. A Power Blues desde que surgiu
vem forjando a ferro e fogo o seu nome na cena do rock brazuca. Como é manter
uma banda hoje na ativa? Quais as maiores dificuldades enfrentadas por vocês?
Daniel
Gerber:
Primeiramente gostaríamos de agradecer ao Blog Fúria 2112 pela oportunidade e
pelo incrível trabalho de acompanhar, pesquisar e levar ao público este
precioso trabalho de registro da cena do rock brasileiro. Para manter uma banda
de rock no Brasil hoje em dia é necessária muita força de vontade, persistência
e amor à música. É necessário ser verdadeiro, senão os obstáculos são tantos
que muitos desistem. As condições do Brasil de modo geral e do “mercado” são
contrários ao que uma banda necessita. Falta de condições, cachês, custo
altíssimo de logística para viajar e contar com o devido equipamento são
verdadeiros desafios. Em adição a isto, voltamos décadas no tempo - em termos
de mídia - para uma época em que o rock ficou relevado a um segundo ou terceiro
plano. Somos novamente um gênero alternativo e de contracultura. Em compensação
o público de rock, ao contrário do que pode dar impressão é enorme.
Daniel Kid
Ribeiro: Manter uma
banda é como manter um casamento, só que a hora do verdadeiro prazer é a hora
do show. Então a nossa eterna busca é em tocar sempre, e manter uma agenda
repleta é o nosso maior desafio no momento.
Paula Mota: Hoje em dia uma banda de rock
tem que batalhar muito, como não tem ajuda de mídia e os cachês quando tem são
baixos seria legal que o público de rock fosse em peso aos shows, sejam em
bares, teatros ou onde for.
2112. A crise levou muitos locais a
fecharem suas portas e os que insistem estão tendo que suar a camisa. Com isso
falta estrutura, cachês decentes, público, patrocínios... O que na opinião de
vocês poderia ser feito a pequeno, médio ou longo prazo para reverter toda essa
situação?
Daniel Kid
R. Hoje o
maior desafio é atrair o público pra fora das suas casas, Smart Tvs e
Smartfones...então tentamos ao máximo ter atrativos para que seja interessante
e compensatória a ida aos shows. Os governantes podem sempre ajudar ao bancar e
estruturar eventos culturais ao céu aberto, estimulando as produções nacionais.
Daniel
Gerber. Primeiramente
que as pessoas que curtem rock comecem a ir mais aos shows ao vivo. Eu acredito
que realmente não seja fácil para a maioria dos empreendedores como donos de
bares e casas de espetáculos, bem como muitas empresas que normalmente
estenderiam patrocínio também tem que operar com cortes de custos
significativos. Solução? Bem, além de o país reverter a crise econômica de modo
geral, incentivos por parte de governo para usar parte dos impostos que
empresas, principalmente as pequenas e médias possam aplicar em cultura ou divulgação.
Isto ajudaria muito, pois faria possível a melhor divulgação e a possibilidade
de aplicar parte dos impostos em melhores cachês e equipamentos à disposição
das bandas. Ou seja, criar sistemas tipo Lei Rouanet ou Proac SIMPLES, para
todos e para valores menores, sem essa elitização de incentivos. Uma tecla que
sempre martelo nas entrevistas é a questão de valorizar mais o produto interno
e parar com infantilidades do tipo "bandas brasileiras X bandas
gringas". Isso de uma certa maneira atrasa o processo de
profissionalização das bandas, não é?
2112. Uma tecla que sempre martelo nas
entrevistas é a questão de valorizar mais o produto interno e para com
infantilidades do tipo “bandas brasileiras x bandas gringas”. Isso de uma certa
maneira atraza o processo de profissionalização das bandas, não é?
Daniel
Gerber. Bom,
vejamos, eu pessoalmente vejo como estímulo para crescer e para que o nível
geral, principalmente em termos de apresentação (show) melhore. Mas é verdade
que muitas pessoas simplesmente não acreditam que bandas nacionais (ou locais)
possam ter o mesmo nível, muitas vezes sem sequer ir aos shows ou escutar a
música produzida aqui. É incrível mas acontece. O Brasil não deve nada em
termos de competência individual de artistas. Muito pelo contrário, exportamos
excelentes músicos e obras por falta de condições de sobrevivência no país. Uma
frase já bem popular no meio diz: “O camarada paga R$800,00 para ver uma banda
gringa mas não paga R$30,00 para ver a banda local tocar”. Infelizmente é
verdade. Existe sim uma espécie de sentimento de inferioridade em relação a que
“tudo que é estrangeiro é melhor”, e não é só no campo da música. Uma grande
bobagem... Mas tendo dito isto, também é verdade que os espetáculos (shows) das
bandas estrangeiras utilizam tecnologia de ponta em termos de som, luz e vídeo,
só que quando eles se apresentam no Brasil todo este equipamento é locado de
empresas locais. Ou seja, está tudo aqui, só não ao alcance das nossas bandas.
Daniel Kid
R. Na verdade
este comparativo é natural, ao ponto que escutamos muito mais rock de fora do
país, onde a cultura é muito mais prolífera. E isso nos torna responsáveis em
trazer ao público um espetáculo com excelência internacional, elevando a
exigência por um show com som, luz e performances irretocáveis. O público está
cada vez mais exigente.
2112. A Power Blues segundo seus fãs
tem hoje uma das mais eletrizantes e dinâmicas performances do rock nacional.
Isso de uma certa maneira gera muitas responsabilidades e expectativas, não é?
Daniel
Gerber. Que nada,
gostamos mesmo é de tocar. Quando estamos no palco damos tudo de melhor, de
forma honesta e principalmente, a gente curte mesmo o som, então vira só tesão
e rock. Não tem nada melhor que o palco e a interação com o público. É muito
mágico. Parece que a vida entra em pausa entre um show e o outro.
Daniel Kid
R. Sim, mas
não enxergamos tudo isso! Agradecemos os elogios e com certeza iremos nos
empenhar pra que o show sempre melhore.
2112. Mas me diga uma coisa: o que uma
pessoa que nunca assistiu a um show de vocês pode esperar?
Paula Mota: Rock, bons sons, diversão e um
ótimo astral.
Daniel Gerber. Música, tocada com paixão, honesta e sem barreiras. Tocamos
de dentro e o que sentimos. É contagiante.
Daniel Kid
R. Blues e
rock da melhor qualidade, tocado com empenho, competência e profissionalismo.
2112. Vocês têm uma extensa folha de
bons serviços prestados ao rock paulista com passagens por diversas bandas.
Qual é a história de vocês?
Paula Mota: Comecei a cantar quando era
criança e meu pai tinha uma banda de baile nos anos 80, ele me deixava cantar
nos ensaios e eu fui pegando gosto pela música, ele era muito exigente então
foi um bom começo... uma ótima escola. Aos 15 comecei a cantar numa bandinha do
colégio, era meio que uma brincadeira mas aprendi bastante nesta época,
viajávamos pelo interior para fazer shows, era muito divertido. Depois disso
passei a me dedicar a estudar e trabalhar e voltei a cantar aos 23 anos na banda
do Paulo Sá chamada Lado C, fiquei por pouco tempo porque estava começando
minha carreira profissional e não tinha muito tempo na época para me dedicar a
música. Mas foi inevitável voltar quando conheci o pessoal do Made em 2008 e me
chamaram para um teste pra ajudar nos backings do disco Rock de Verdade, gravei
com eles e fiquei até 2013 quando sai e acabei começando minha própria banda,
chamada Deu pau lá no Blues que se transformou em Power Blues com a entrada do
Daniel em 2014, ele trouxe o autoral e deu um novo sentido a banda, amei as músicas
dele e entrei de cabeça, aí foi mudando totalmente a formação até chegar no que
é hoje.
Daniel
Gerber. Bom, eu,
comecei aprendendo vários instrumentos aos 11 anos e aos 12 ganhei a 1ª
guitarra, isto foi em 1073/74. Fui passando por bandas nos anos 70 na
adolescência, e no início da década de 80 participei do Santa Gang, da banda
Metrópole (1ª Gravação em disco) e finalmente do Made in Brazil banda que
participei como guitarrista e parceiro musical em 2 discos: Deus Salva o Rock
Alivia (1985-86) e Made in Blues (1990). Depois já morando nos USA fiz parceria
com o Oswaldo Vecchione em mais 5 músicas gravadas pelo Made no disco Sexo,
Blues e Rock and Roll (1995). Nos Estados Unidos participei de algumas bandas
como The Mongrels e Charlie Doc Band. De volta ao Brasil Power Blues na cabeça.
Daniel Kid
R. Bem, eu já
estou nesse rock a 21 anos. Trabalhei anos como roadie da Patrulha do Espaço,
tive alguns trabalhos autorais de diversos estilos como o Natural Reggae,
Impacto Mosh e Sons de Saturno, trabalhei com diversos artistas como sideman
com o quarteto vocal A Quatro Vozes, Ozi, Chico Suman, Casa das Máquinas,
Prospero Albanese e Toni Tornado. No momento também trabalho com Walter Franco
e seu filho Diogo Franco, com o Ronaldo e Os Impedidos,Marquês,Rockover e
Satisfactor.
Daniel
Gerber (por
Franklin Paolillo). O nosso baterista Franklin Paolillo tem uma “folha de
serviços” vastíssima que inclui Rita Lee e Tutti Frutti, Made in Brazil, O
Terço, Joelho de Porco, Raul Seixas, Marcelo Nova e mais uma quantidade de
banda e artistas ao longo de 50 anos de carreira. Logo após terminarmos as
gravações e mixagem do 1º álbum da Power Blues, ele sofreu um acidente vascular
e está em recuperação. Por sorte vemos progressos semana a semana, mas é
necessária muita paciência. Enquanto isto o (excelente) baterista Roby Pontes
(Golpe de Estado) está substituindo nos shows da banda.
2112. Ano passado vocês lançaram o tão
esperado primeiro álbum da banda. Havia muita cobrança por parte dos fãs?
Daniel
Gerber. E nós
mesmos não víamos a hora de gravar. Acabamos levando mais tempo para caprichar
na gravação. Além da performance em si (execução) gastamos tempo e atenção nos
timbres, diferentes tipos de microfones no processo de captação, na”separação”
de instrumentos, a timbragem geral, já que tudo isto define o som da banda, até
o processo de masterização levou seu tempo. Mas chegamos ao ponto que
queríamos. Então acabamos no final de Dezembro de 2018. Vamos lançar neste
primeiro semestre de 2019.
2112. Diante dos "free
dowloads" está compensando investir na gravação de um cd? Pergunto isso
levando em conta os altos custos que envolvem todo o processo de uma gravação
como estúdio, arte gráfica, prensagem, produtor, técnicos... Como reagir diante
dessa situação?
Daniel
Gerber. Financeiramente
não. Não compensa. Mas musicalmente sem dúvidas. Pois ao invés de 1 ou 2 músicas
estamos gravando uma obra inteira, que tem sequência, é muito mais rica e com
substância.
Daniel Kid
R. Infelizmente
não. Mas sem um disco lançado fisicamente pro mercado uma banda não existe
né... então chegou a hora de nascer.
2112. Vocês poderiam falar um pouco
sobre as gravações e quanto tempo tiveram em estúdio?
Daniel
Gerber. Bom, no
total foram mais de 70 horas. Isto sem contar masterização e pré-mixagens.
Poderíamos ter usado bem mais, mas tivemos a sorte de escolher um estúdio
fantástico, o Orra Meu, e isto ajudou muito a economizar tempo de timbragem,
mixagens e mesmo em gravação. Gravamos com a dupla. André Miskalo e Gustavo
Barcelos, que são excelentes profissionais, também são músicos e conhecem muito
bem o equipamento. Inclusive ajudaram muito no passo a passo da produção em si.
A Paula gravou todos os vocais, back vocals e percussão, o Daniel Kid tudo em
contrabaixo e alguns back vocals também. O Franklin (Paolillo) gravou todas as
baterias e percussão. Eu gravei as guitarras e dei uma palhinha em um back
vocal. Cada um escreveu seus próprios arranjos em termos de instrumentos.
2112. Entre as faixas gravadas quais
vocês destacariam?
Daniel Kid
R. Não dá pra
destacar uma faixa ou um momento do disco, ele foi criado paqra, apesar de ser
repleto, soar como uma coisa só.
Daniel
Gerber. Esta
pergunta é difícil de responder. Como não são todas do mesmo estilo, eu prefiro
elas de acordo a como estou me sentindo no momento. São como filhotes. Gosto de
todas.
2112. O álbum traz nove temas autorais
o que os diferencia dos demais álbuns do gênero que sempre inclui releituras de
grandes clássicos. O que levou vocês a fazerem o caminho inverso e como é o
processo de composição da banda?
Daniel
Gerber. Somos uma
banda autoral por essência. A música emana, é impossível represá-la. O nosso
foco, acima do virtuosismo individual é nas composições e na sonoridade de
forma geral. Nós seguimos uma linhagem de rock autoral paulista e brasileiro
que não pode parar no tempo nem de evoluir. Na verdade eu até queria gravar
alguma releitura, mas temos tantas músicas para apresentar que acaba ficando
para trás. Nos shows ao vivo apresentamos algumas que gostamos muito. Quanto ao
processo de composição não há regra fixa. Algumas começam a partir de um Riff,
outras pela harmonia e outras pela letra.
2112. Como foi feita a seleção das
músicas a serem gravadas? Foi na base do sorteio?
Daniel Kid
R. Elas se
escolheram por si só... pensamos nas que estavam mais amadurecidas nas
execuções ao vivo e na recepção positiva do público.
Daniel
Gerber. A seleção
foi feita mesmo nos shows à medida que íamos tocando e também pela sequência
(que eu mencionei acima) do conjunto da obra. Procuramos um equilíbrio em
termos de ritmo, letras (conteúdo) e estilos, criando uma sequência que seja
natural e não sature em nenhum ponto.
2112. Já ouvi muitas pessoas dizerem
que o blues perde muito da sua essência quando gravado em estúdio justamente
por ser um estilo musical que sempre atinge o seu ápice ao vivo nas longas
jams. Isso é real?
Daniel
Gerber. Em parte
sim. Mas o Blues, talvez pela origem africana, tem uma “batida” hipnótica -
esta combinando bateria, cbx e base - isto eu presenciei em shows de grandes
mestres como B.B. King, Magic Slim, Albert Collins, Albert King, Buddy Guy e
vários outros, ao mesmo tempo o Blues rock tem a mágica da guitarra, vi um bom
número de shows, de guitarristas de Blues e Blues-Rock, e embora ao vivo
chega-se a um ponto realmente mágico, após tocar uma música ao vivo muitas
vezes, conseguimos sintetizar e captar o melhor dela, aí vem a capacidade de
condensar e gravar para passar essência de cada tema. Preparar música para ser
gravada em estúdio merece uma compreensão da estrutura e do que gera o feeling.
O conceito é um pouco diferente, tem que ter dedicação.
2112. Muito bacana da parte de vocês
citarem Made In Brazil, Os Mutantes, Rita Lee & Tutti Frutti... como
influências diretas no som da banda quando a maioria citam apenas bandas
gringas. O que mais vocês ouvem?
Daniel Kid
R. Eu ouço de
tudo um pouco realmente, dou preferências pra produções setentistas. Prefiro
não citar nomes, mas ouço muita coisa mesmo!
Daniel
Gerber. Bom,
deixaria de ser uma entrevista e passaria a enciclopédia musical ..... rss
Paula Mota. O que eu mais ouço é rock
setentista como Grand Funk, Free, Humble Pie entre outros e muitas bandas
brasileiras como Tomada, Baranga, Pedra, Golpe de Estado, Carro Bomba e por aí
vai....
2112. Quais os projetos de vocês para
este ano? Teremos o lançamento de um álbum ou um EP?
Daniel
Gerber. Iniciamos
por gravar e lançar o vídeo clipe de “Mentes Criminosas”, a música também será
lançada em plataformas digitais etc. Partimos a partir de abril para a turnê de
lançamento do CD, apresentando a obra conjunta e já algumas novas que começam a
fazer sua estréia ao vivo. O CD físico completo vai ser lançado durante o ano.
2112. ... o microfone é de vocês!
Daniel
Gerber. No ano
passado, o Brasil foi o 2º maior em número de downloads de rock no mundo da
Spotify , mais de 34 milhões (fonte: Paulinho Heavy-progarma É-noize), temos um
público incrivelmente vasto, só que não conseguimos organizar em termos de
sobrevivência dos músicos e produções dignas para as bandas (e artistas em
geral, claro), então, ao invés de lamentar estamos muito entusiasmados para
compor, tocar e divulgar rock tupiniquim de primeira. E vamos em frente!
Dedico esta entrevista ao mestre da batera: Franklin Paolillo
Fotos:
Lincoln Baraccat
Próxima entrevista: Clementines, dia 22
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