Conheci o trabalho de Luma Schiavon através de um comentário do músico Júlio Ferraz (já entrevistado aqui!). Saí a procura de material na internet e acabei entrando no canal da cantora no YouTube onde pude não só conhecer sua música como assistir aos seus ótimos clipes. O passo seguinte não foi outro senão convidá-la para a entrevista que segue abaixo.
2112. Luma, você começou a cantar com dezesseis anos participando de bandas e acompanhando outros artistas. Fale um sobre a experiência de começar tão cedo.
Luma. Esse ano vou completar incríveis 10 anos de carreira. Essa é a melhor parte de ter começado cedo. Pude pegar muita experiência, vivenciar de tudo pra chegar aos 20 e poucos tendo a certeza do caminho que gostaria de seguir. Passei por tudo que você pode imaginar, toquei em casamento, aniversário, boteco da esquina, festival de música, coral de igreja, banda de música sertaneja... Essa bagagem me proporcionou a coragem e segurança de manter a carreira autoral e os objetivos que tenho hoje.
2112. Nesse período de adaptação com os palcos, compor... o que foi mais difícil superar mas que serviu de aprendizado para a vida?
Luma. Eu passei por uma fase emocional muito difícil há cinco anos que com certeza foi o momento mais complicado não só de carreira mas de vida. Meu desgaste emocional começou a afetar diretamente a minha voz, uma espécie de somatização. Rouquidão, perda da voz no meio de shows, dias sem conseguir falar nem cantar. Pensei em desistir da música. Passei por otorrinos, fonoaudiólogo, até perceber que não era algo físico e, sim, emocional. Depois de muita luta posso dizer hoje que consegui vencer essa barreira e, só então, lidar com a carreira autoral.
2112. Minas possui uma das cenas mais sólidas com grandes nomes da MPB, rock, jazz, metal, punk, alternativo... que resulta numa grande massa sonora. Você é do tipo que está sempre aberta a novas influências?
Luma. Muito aberta, mas muuuuito mesmo. Eu amo ouvir coisas novas, ver o que tá acontecendo na minha cena e fora dela pra ver se consigo adaptar algo pra minha música. Principalmente na Nova MPB e no indie brasileiro, que são mais minhas áreas, tô sempre de olho nos novos artistas.
2112. O que você escuta em casa ou nas plataformas digitais?
Luma. Ultimamente tenho escutado coisas bem próximas ao que faço, mas no geral gosto muito de MPB dos anos 70, rock psicodélico, blues, indie em suas diversas vertentes, seja indie rock, pop ou folk. Ouço bastante música setentista, ou alguma influenciada por ela. Às vezes reggae, também, já tive até banda de reggae. Pra alguns isso pode parecer eclético, mas eu acho até bem centrado...
2112. Você é muito vintage ou curte todos os tipos de música? Algum cantor, músico ou banda em especial?
Luma. Eu gosto bastante da pegada vintage, mas jamais serei uma pessoa apegada somente a coisas antigas. O que eu tenho buscado bastante é ouvir o que tem rolado no meio indie como um todo, pois fiquei afastada da cena por um tempo, e agora tenho engolido tudo que aparece. Gosto muito do novo influenciado pelo velho. Sobre artistas específicos, eu já fui de citar, mas hoje por mudar tão frequentemente de gosto, prefiro não pontuar nenhum específico.
2112. Como é trabalhar esse vasto universo musical dentro de você para criar um universo com a marca da sua personalidade?
Luma. Difícil demais. É muito difícil aliar o que gosto com o que quero fazer e, pior ainda, com o que eu quero que as pessoas escutem. Então, no final das contas, eu acabo não dando muita ideia pra essa cisma. Deixei as músicas fluírem e depois, conforme as pessoas foram dando o feedback, percebi que tinha deixado minha personalidade fluir ao ponto de ficar marcante de um jeito que jamais planejei.
2112. Nos seus shows você tem costume de fazer releituras ou toca apenas suas composições?
Luma. Por enquanto preciso fazer releituras. Lancei por enquanto apenas um EP com 5 canções e dois singles super recentes, então adiciono músicas que me influenciaram nas composições e outros artistas que gosto muito. Tem de Ave Sangria à Duda Beat no set!
2112. O espaço para a boa música está cada vez mais reduzido em função desse imidiatismo musical que domina as paradas de sucessos. Como você trabalha sua música nessa via de mão dupla?
Luma. Eu não acredito que o espaço esteja reduzido. O que se vê é o mesmo de sempre. O mainstream de rádio e TV nunca abriu espaço pra quem não tivesse como pagar ou algo a oferecer de outra forma. E, assim como nossos grandes ídolos passaram pelo underground por anos até terem espaço na grande mídia, eu não trabalho pensando muito nisso. Tem um espaço muito grande que passa longe da grande mídia e que se autoalimenta muito bem. Não a toa a gente vê diversos festivais de pequeno e médio porte acontecendo no país inteiro, artistas independentes vivendo tranquilamente fazendo seus shows por aí, vendendo merchan, juntando público. Eu me vejo mais nesse rolê do que em qualquer outro.
2112. Já ouvi muitos músicos reclamarem dos valores irrisórios pagos pelas plataformas digitais. Qual a sua opinião sobre o assunto? Compensa ou não?
Luma. Demorei mais de um ano pra conseguir ganhar míseros 50 reais com streaming. É um absurdo mesmo. Mas como meu público-alvo e o de muita gente, inclusive eu mesma, consome música através das plataformas, eu acho que é necessário estar lá mesmo sem ser recompensado com o dinheiro propriamente dito. Não tem como fugir muito. Já vi alguns artistas tentando outras formas, mas não querer colocar música em streaming é se isolar e perder a chance do público te achar e você conseguir ganhar dinheiro de outras formas.
2112. Você poderia falar um pouco sobre o espetáculo "Luma Canta Divas". Qual foi o critério usado por você na escolha do repertório para montar o espetáculo?
Luma. O Luma Canta Divas foi a realização de um sonho. Grande parte da minha carreira aconteceu com o violão no colo em barzinhos, sem ter muita liberdade de escolha de repertório ou a oportunidade de fazer um show quebradeira de palco. Apesar de vivências anteriores, eu levo em conta que minha experiência real de palco começou com esse show. As músicas escolhidas foram em sua maioria de mulheres que eu admiro absurdamente na música. Não quis colocar nada muito clichê, como Malandragem da Cássia Eller, porque eu já tava de saco cheio disso de barzinho. Coloquei Joss Stone, Amy Winehouse, Janis Joplin, Rita Lee, Rihanna, Beyoncé, Adele, e consegui fazer de uma forma coesa, sem que soasse estranho. Foi um sucesso enorme, fiquei muito feliz, foi uma fase maravilhosa de consolidação da Luma mais roquenroll e menos emepebê.
2112. Janeiro (Headband) seu primeiro single foi lançado em 2020 com produção do Celso Moreira. Qual é a sensação de ver sua composição criando vida própria? Foi você mesmo quem fez os arranjos?
Luma. A história dessa música, como acredito ser a história da primeira música de todo compositor, me soa até surreal. Eu compus ela com 14 anos e foi a primeira música que acreditei ser boa suficiente pra ser gravada. Eu nunca fui muito segura de mim nem nada disso, então demorei praticamente dez anos pra criar coragem de gravar minhas músicas. Obviamente, nesse processo, eu não tinha a mínima confiança de criar os arranjos. Entreguei a música gravada simploriamente em voz e violão para o Celso e ele fez todo o restante.
2112. A boa aceitação do single gerou um convite para participar da live #ArteSalva transmitida pela Rede Minas ao lado do menestrel Zé Geraldo. A experiência abriu portas para sua música?
Luma. Claro. Mas a porta mais importante já tinha sido aberta, que foi a porta chamada Zé Geraldo. Mais do que conseguir novas oportunidades, naquele momento o que mais me importava era a honra de ter sido convidada a apresentar logo de cara minha primeira canção com o Zé. A confiança que ele colocou em mim me deu uma força enorme pra começar a lançar um single atrás do outro e, desde então, não parar mais. Mas, fora isso, a experiência abriu portas com toda certeza. Assim que lancei o EP, por exemplo, a Rede Minas me convidou para uma entrevista maravilhosa no programa Agenda.
2112. Como foi trabalhar com Zé Geraldo?
Luma. O Zé é meu ídolo mas também é meu amigo. Quando ele viu que eu tava levando a sério esse negócio de música, assim que teve a oportunidade, me apresentou pro mundo. Ele mais do que ninguém sabe a dificuldade que é sair de uma cidade como Rodeiro e conseguir alçar voo. Fico muito feliz de ele confiar no meu trabalho e me ajudar a chegar nos lugares onde quero chegar. Conversamos sempre sobre o que estamos planejando e ele acompanha assiduamente tudo que faço e vice-versa. É uma relação maravilhosa.
2112. Você escreveu o roteiro, dirigiu e editou o vídeo clipe de Valsa do Adeus seu segundo single. Como é estar no comando da própria obra?
Luma. É a melhor coisa do mundo! Enquanto eu puder, vou querer estar sempre a frente da parte técnica dos meus trabalhos. A gente sabe que nem sempre isso é possível, mas por enquanto tenho trabalhado em todas as áreas dos meus clipes, de figurino a edição final e divulgação. Eu gosto muito dessa parte, é com certeza uma das coisas mais gratificantes na minha carreira.
2112. Nos dias de hoje em meio a tantas coisas ruins o que é ".... perder o medo de ser, o que tiver de ser e ainda ser além"?
Luma. Acho que, lá no fundo, a gente só quer ser aceito do jeito que é, inclusive o lado ruim. O primeiro passo é se aceitar pra depois se mostrar sem medo pro mundo, seja ele sua família, seus amigos, seus colegas de trabalho... Na Valsa do Adeus eu procuro falar sobre essa aceitação interna, mas agradeço também por ter uma família que me aceita como eu me mostro. O outro só vai nos aceitar se nós tivermos a confiança de nos mostrarmos sem medo.
2112. O que te influencia na hora de compor? Você curte parcerias ou prefere compor sozinha?
Luma. Por enquanto, eu costumo compor quando tenho picos de emoção. Se estou muito feliz, triste ou com raiva componho melhor. A raiva costuma ser um grande motor pra composição. Geralmente preciso de algo mexendo mais comigo para escrever uma boa canção. Sobre parcerias, até então eu só gravei composições totalmente minhas ou totalmente alheias, ainda não tive a oportunidade de compor de forma conjunta... Espero logo tê-la.
2112. Como blogueiro já passei aperto quando pinta uma inspiração e aí você procura um lugar para anotar e não consegue. Você já passou por situações semelhantes?
Luma. O que mais me irrita é quando eu sonho com algo, acordo, escrevo e depois não entendo nada do que escrevi. Passei por isso tantas vezes que nem anoto mais! Kkkkkkkkk Só escrevo quando tô bem acordada e sabendo o que tô fazendo.
2112. Apesar do nome do single a capa remete a um passado não muito distante com pessoas brincando de ciranda. Como é trabalhar o presente sem abrir mão de velhas tradições?
Luma. Eu tenho uma convivência muito próxima com minha família. Ali na capa estão minhas tias com minha avó e, como a letra da música tem a ver com a nossa relação, eu quis colocar uma foto delas na capa. Pra mim é muito natural a mistura musical do novo com o que acostumei a ouvir com meus pais, então nunca parei pra pensar nessa mistura. Acho que ela faz parte do que eu sou.
2112. Bacana isso. Valsa do Adeus teve melhor desempenho que Janeiro (Headband). Isso de te deu mais segurança para avançar o sinal?
Luma. Com toda certeza. O resultado foi bem inesperado e me deu um gás enorme pra lançar o EP pouco tempo depois. Eu ainda não sabia quando ia lançar, mas como os dois singles foram muito bem recebidos, eu mergulhei de cabeça em tudo dali pra frente, tanto que foi lançamento atrás de lançamento desde então.
2112. "Minha Lucidez é Minha Ruína" é a resposta do que estamos conversando ao receber apoio dos jornais, blogs e canais de tv. Qual o balanço que você faz disso tudo?
Luma. Eu nunca esperei conseguir tudo isso em um ano. Quer dizer, em menos de um ano eu tinha conseguido chegar em lugares que artistas locais nunca conseguiram em anos de carreira. Sei que trabalhei muito e que foi merecido, mas mesmo assim foi muito além do esperado e era a resposta que eu precisava pra seguir na música de olhos fechados. Eu queria que quando eu escolhesse trabalhar de forma autoral as coisas fluíssem de tal forma que eu não tivesse a sensação de que preciso ter um plano B, e elas fluíram. Me sinto segura e contemplada.
2112. O vídeo de Luzes e Cachaça foi realizado através do coletivo “Meus Clipes São Minha Ruína”. Essa tem sido uma boa solução para quem é artista independente, não é?
Luma. É um caminho muito bom pra quem sabe que já tem um certo apoio, porque dependendo do valor que a gente busca, não ver a meta do financiamento coletivo sendo batida é meio doído. Eu sabia que conseguiria pelo menos metade do valor, que era baixo, mas acabei sendo surpreendida e ultrapassando a meta. Foi uma experiência incrível mas muito difícil também, pois fiz tudo sozinha e foi muita coisa, porque além do clipe tinham as recompensas para serem entregues, mas ficou de aprendizado. O resultado foi maravilhoso e é isso que importa.
2112. O incentivo a cultura deveria se concentrar mais no artista que está iniciando carreira, você não acha?
Luma. Não sei... Porque num país tão fraco de incentivo, artistas que estão há 20 anos na estrada acabam por sofrerem das mesmas dificuldades financeiras que os artistas que estão começando. É uma questão complicada, mas eu acho que a régua de medida deveria ser outra. O que precisa muito mais de mudança é a questão burocrática da coisa. Conseguir incentivo financeiro cultural é sempre muito difícil, você precisa ser um ninja pra conseguir algo.
2112. Para os próximos meses teremos o lançamento de novos singles ou um álbum completo? Qual é o seu próximo passo?
Luma: Minha meta principal pra esse ano era lançar pelo menos mais um single a cada semestre. E já consegui lançar dois! Um atrás do outro! Tô muito feliz com ambos, pois foram minhas primeiras colaborações. Calmaria foi um single lançado com clipe, uma música que eu apenas interpretei e foi composta por um super amigo, o Matheus Saretti. A outra foi Você Vai Entender, numa pegada completamente diferente, bem leve, com a Tria Arás. Foram duas super conquistas. Quero lançar pelo menos mais umas três músicas durante o ano, mas se eu conseguisse lançar mais um EP seria incrível. Tudo pode acontecer!
2112. O circuito de shows começou a normalizar com os bares e teatros promovendo vários eventos. Qual o seu telefone/e-mail para contratar seus shows?
Luma. Finalmente estamos de volta. Tô com um show super completo, com uma banda ainda mais completa e disponível pra rodar esse país todo. Meu email é lumaschiavon@outlook.com e, caso necessite de telefone, é só me pedir por ele. Também é muito fácil entrar em contato comigo pelas redes sociais. É só procurar por Luma Schiavon em qualquer uma delas.
2112. ... o microfone é seu!
Luma: Queria primeiro agradecer o convite e o espaço! Agora convido a quem não me conhece, ou ainda não ouviu as músicas novas a conhecer meu trabalho, material não falta. Tem muita coisa bacana por agora e muita coisa ainda por vir. Um abraço!
Obs.: Todas as fotos utilizadas nesta postagem foram retiradas do Facebook da cantora. Não deu para identificar o nome dos autores das fotos. Quem tiver alguma informação favor entrar em contato através do meu e-mail: furia2112@gmail.com que eu faço as devidas correções.
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