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domingo, 13 de setembro de 2020

Homenagem se faz em vida: Fuguetti Luz

Um dos maiores nomes do rock brasileiro e um dos grandes ícones do rock gaúcho Fuguetti Luz vem desde os anos 60 lutando primeiro a frente do Liverpool, depois o Bixo da Seda e por último em carreira solo. Um gênio que merece essa homenagem em vida. 



Vinte anos atrás, no trabalho de jornalismo e escrevendo para o Jornal Armazém de Notícias, dirigido por Crizante Quadros Júnior, tive o privilégio de realizar uma entrevista com um dos, senão, o mais importante dos músicos do Rio Grande do Sul, que trouxe o “rock’n’roll” gaúcho para as paradas musicais no Brasil nos anos 80/90.

Lá pelas décadas de 60/70, a efervescência cultural em Porto Alegre, mostrava um seleto grupo que nascia para transformar uma geração de músicos que fizeram bonito nos palcos do RS, do Brasil e do mundo.

Esta parte dos Cadernos da Historiografia Tapense, em seu volume V (1990/2020), apresenta uma entrevista com “Fuguett” Luz, como ficou conhecido o Mestre de muitas bandas, compositor de dezenas de letras de sucesso nas rádios FM, e na geração de músicos roqueiros nascidos sob a influência deste músico, compositor, um artista, como disse, de grande importância para a história da música do Rio Grande do Sul.

Na época, faziam apenas dois meses que havia se mudado para Tapes, RS onde ainda aqui reside em sua casa no centro da cidade, e suas palavras e idéias, mesmo passados 20 anos, duas décadas, ainda servem para uma reflexão da geração atual, principalmente aquelas pessoas que detém os poderes e precisam saber utilizá-los em prol da cidade, da natureza e do povo.

Espero que gostem deste artigo que produzi para a Coluna “Rádio-Grafia” do Jornal Armazém de Notícias, da edição de outubro de 2000.

Cadernos da Historiografia Tapense – Volume V

Título: Sob a Luz do Portal Existe Vida

Texto:

Tapes, em uma língua indígena remota a nossa civilização, tem um significado que pode ser um prisma para interpretações diversas, e cada leitor pode ter uma idéia a respeito, através de vivências e fatos que confirmam o que a lenda sugere: Tapes = Portal de Luz.

Isso mesmo, estamos quem sabe em um lugar sagrado, e que durante séculos foi visitada por habitantes de áreas longínquas de nossa enseada, denominada saco de Tapes.

Este lugar era para os primeiros habitantes, o que definiam como porta para a “Terra que não há males”, e que com certeza poderia ser também uma idéia de ante-sala para o Paraíso Bíblico.

Aqui, os mesmos tinham um potencial ecológico e de subsistência que manteria a tribo viva e alimentada durante os períodos climáticos desfavoráveis para a caça, pesca e coleta de frutos.

Viviam em perfeita harmonia com o ambiente em seu tempo, protagonizando na história de nossa cidade um elo de ligação, nossa com Luz que queremos, pois seres de outras paragens aqui chegam todos os dias, atraídos pela beleza de nossa lagoa, de nossas praias, de todas as matas e animais silvestres, da paz reinante e do ar vivificante, para nela também brilharem, pois aqui “o Sol, nasce para todos”.

Neste primeiro “Rádio-Grafia” do Jornal Armazém de Notícias, Júlio Wandam descobre que nosso entrevistado tem muito à ver com a Luz, pois ele sempre teve a Luz brilhando em seu caminho, e onde vai nos falar de seus pensamentos sobre a juventude, ecologia, futuro e de sua opção por Tapes.

Fuguett Luz, ou Marco Antônio Figueiredo Luz, filho de João Luz e Leonita Drummond de Figueiredo é por assim dizer um “Iluminado”. Nascido em 10 de março de 1947, na localidade de Salto, onde estava sendo construída a barragem para a hidroelétrica e seu pai participava das obras. Em 1950, aos três anos de idade, depois de ter sido descoberto um surto de poliomielite no país, onde 23 mil crianças tiveram o mesmo destino, o menino que tinha uma disposição enorme para as traquinices da infância, se vê paralisado pela doença.

Mesmo assim, teve a presença marcante de sua mãe em todas as fases de sua recuperação. Dona Leonita não poupou esforços para manter a tarefa sempre em dia: pegava dois ônibus para levar Fuguett para as massagens, cuidava da casa e dos filhos e mantinha o espírito elevado na família.

Após cinco anos de idade, sua mãe é recompensada com o caminhar com as próprias pernas e da liberdade de poder ir e vir para qualquer lugar.

Assim, conheceu o Brasil e a Europa, fez em sua época, aquilo que muitos esportistas deficientes fizeram a pouco nas Paraolimpíadas de Sidney, onde quebraram suas limitações e foram a luta, trazendo mais medalhas de Ouro, Prata e Bronze que os atletas sadios e bem treinados para as provas.

Muitas medalhas Fuguett obteve em sua trajetória e hoje é reconhecido como cidadão de grande quilate em meio a sociedade gaúcha e porto-alegrense.

Na adolescência, quando teve de frequentar a escola, enfrentou a barra da discriminação, ficando quase um ano, apenas curtindo o mundo de suas janelas, no bairro IAPI, um celeiro de cultura de décadas atrás e que gerou para a cena musical do estado uma enormidade de grupos e bandas de Rock que ainda fazem sucesso nas rádios FM.

Nesta fase, enclausurado por conta própria, Fuguett novamente estava sendo ajudado por sua mãe, que como diz, sempre dava uma luz com suas mensagens de apoio e auto-estima e que o ajudaram a criar asas para o mundo, ou melhor, ajudaram a lançar o foguete Luz e Paz em meio a Juventude de Ontem, Hoje e do Amanhã.

Sua proximidade com Tapes aconteceu na juventude, quando casou com Janete Petry, a Zefa, seu primeiro e permanente amor nesta vida. Teve apenas uma filha, Shanti, nascida em suas viagens pela Europa, na Holanda.

Ajudou na criação de várias bandas como Bixo da Seda, Liverpool, Bandalieira, Taranatiriça, Guerrilheiro Anti-Nuclear e influenciou outras tantas no Rio Grande do Sul.

Muito mais teríamos para falar desta figura sem igual na história, e que a cada passo transforma um pouco a realidade cinza em algo mais colorido e feliz.

JAN - Na atualidade, o que você pensa sobre o campo artístico em geral?

Fuguett - Está muito massificada, as rádios estão massificando muito, com esse negócio de “Jabá” vindo das gravadoras. Eu gostaria que se abrissem mais os espaços para os independentes, a nova geração que está surgindo. Acredito que está pintando uma nova geração, e daqui uns quatro anos estará pintando uma música nova. Na realidade sinto que está meio frustrante, a coisa está meio estressante, meio estagnado. Uns massificam de um Aldo, outros falam besteiras de outro, então está prá acontecer uma novidade, pois acredito na juventude, pois são eles que trazem as novidades.

JAN - No campo político atual, qual sua opinião?

Fuguett - Acho que nosso povo está sendo muito judiado. Eu penso que esse negócio de centralizar tudo em Brasília é meio estranho. Esses casos de gente ganhando milhões e o povo ganhando salário de fome, isso aí não tá certo. Nós não queremos revolução com armas, nós queremos uma revolução cultural. Espero que a gente realmente não marque bobeira, vendo os caras ganharem 8 milhões por mês e outros ganhando 151,00 por mês. A gente tem que refletir bastante e não dá moleza prá otário.

JAN - No campo social, qual seu destaque no momento?

Fuguett - Vejo, que o importante é pensar na criança e na juventude, não sacanear o futuro delas. Trazer mais cultura, mais alimentação básica para nossas crianças. Cuidar das cidades, do nosso sistema de vida. Não podemos passar por cima dos outros, com esse sistema que é o capitalismo. Penso que o povo tá vivendo no buraco. As crianças tem que ter mais saúde, mais alimentação, mais cultura.

JAN - No campo internacional, qual sua projeção para o Brasil?

Fuguett - O seguinte, bicho, a gente tem que botar mais o nosso idioma na roda, nós estamos sendo muito americanizado, os caras tão copiando o hino dos EUA até hoje. E os Gringo estão se cagando prá nós. Eles são espertos por que são mais rápidos, por eles terem a velocidade da eletrônica na mão, estando a frente com o poder atômico na mão, eles tem o controle da cultura no mundo, com as rádios tocando musica estrangeira prá caramba por aí. Eu acho que nós tínhamos que dar mais valor ao que é nosso. E não é nem o Português é o Brasileiro. Nossa língua é Brasileira. Queremos nos expressar como nós somos. As pessoas não estão Abrasileiradas.

JAN - Na questão ambiental local, o que tens a dizer?

Fuguett - Estou chegando a pouco em Tapes, apenas dois meses, estou gostando e estou encontrando pessoas legais e todos os dias têm observado a lagoa, e ela continua suja cada vez mais. Até aproveito para pedir para o próximo prefeito, que o mesmo dê prioridade para a questão da lagoa, toda a cidade que tem água é abençoada. Se a lagoa estiver limpa, o turismo vai aumentar em Tapes, vai gerar mais trabalho. As pessoas estão muito pobres aqui, e o trabalho além de dar condições de vida melhor, o cara sai da miséria espiritual, pois uma miséria trás a outra, entende. Penso que deva ser cuidada água, pois a água é sagrada, principalmente neste momento que estamos vivendo, com a camada de ozônio muito afetada, o sol está queimando a pele, o buraco nos pólos aumentando, então a lagoa tem que ser cuidada, não podendo ficar abandonada como ela está. Se a prefeitura nestes quatro anos, der prioridade para a lagoa, vão com certeza se reeleger, pois o povo vai votar neles de novo. Quero acreditar que isso seja prioridade mesmo, pois isso é sagrado.

JAN - Sobre o futuro, quais suas metas?

Fuguett - Em primeiro lugar, eu quero meditar um pouco. É a primeira vez que me sinto livre, sem pensamentos, só pensamentos bons na cabeça, feliz, tranqüilo. Passei minha vida toda na estrada, prá lá e prá cá, atravessei metade do Brasil e metade da Europa, e aprendi muita coisa e vou continuar aprendendo, pois esse é o objetivo da vida, o que temos que fazer é aprender. Então agora quero meditar, quero brincar, que cantar uma poesia, quero cantar rock’n’roll com o galo do Mig (Miguel Buchaim), presente no momento da entrevista). Quero ver se trago mais arte para Tapes, ajudar as pessoas que querem crescer e trazer arte para a cidade, e já estou articulando a vinda neste verão de algumas bandas, além de dar uma força para as que aqui estão surgindo.

Por Júlio Wandam

Fonte: Jornal Armazém de Notícias (RS)

Edição: Outubro

Ano: 2000

Página: Coluna Rádio-Grafia

Imagens:

Um Milhão de Metros

Revista ZH



Obs.: Só consegui identificar o nome de dois fotógrafos: Ana Laura Leal e Lincoln Baracatt.

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