O blog 2112 foi formado com intenção de divulgar as bandas clássicas de rock, prog, hard, jazz, punk, pop, heavy, reggae, eletrônico, country, folk, funk, blues, alternativo, ou seja o rock verdadeiro que embalou e ainda embala toda uma geração de aficcionados. Vários sons... uma só tribo!



quarta-feira, 10 de julho de 2019

Entrevista Banda HexWyfe



A HexWyfe é uma banda carioca que une três vertentes do rock que eu gosto muito: o hard, o metal e o prog. Assisiti alguns clipes da banda e as meninas pegam pesado em shows super energéticos e furiosos. Na entrevista elas abrem o jogo sobre vários assuntos sem nenhuma censura. Keep on rock!!

2112. A HexWyfe está na estrada a três anos. Como vocês resumiriam a história da banda?

Mili. Começamos a ensaiar no final de 2016 tocando covers para entrosar as musicistas e posteriormente partimos para as músicas autorais. Antes da Julia entrar na banda tocamos com duas outras baixistas. Uma fez parte da fundação da banda e outra ficou apenas para cobrir alguns shows marcados. A Julia está na banda há um ano. Fizemos a maioria dos shows da banda com ela, que também gravou as linhas de baixo da nossa single “Final Hour”, disponível atualmente no Soundcloud.

2112. Vivemos num país onde a cultura é vista como um produto totalmente irrelevante. O que impulsiona vocês a manterem uma banda na estrada?

Debs. Só uma coisa justifica tanto esforço, o amor a música, no nosso caso ao rock e a consciência de que nosso trabalho não é vazio em termos de conteúdo.

Mili. Concordo com a Debs.  Gosto muito de tocar com banda. Não vejo graça em tocar guitarra sozinha em casa.

2112. Sei que pode soar meio clichê em pleno século 21 mas o metal/hard rock sempre teve fama de ser um clube fechado, machista. Como é manter uma banda apenas com garotas na formação?   

Debs. Manter uma banda apenas de mulheres num pais machista como o Brasil é quase como declarar Guerra ao Sistema. Em várias situações fomos literalmente discriminadas apenas pelo fato de sermos mulheres.

Mili. Quando morei em Curitiba, toquei em algumas bandas com formação masculina e feminina. Na banda que fui a única integrante feminina, fui alvo, algumas vezes, de piadas machistas quando subi no palco antes de começar a tocar. Mas após as primeiras músicas do set list os engraçadinhos ficavam calados e se retiravam por conta própria. Com relação a outras bandas com integrantes masculinos eu era bem respeitada. Sempre recebi convites para churrascos e festas da galera do metal. Era um clima bem bom entre as bandas. O preconceito vinha do público mesmo. Na banda os meninos sempre me ajudavam a carregar meu amplificador (Viu só como é bom ter homem na banda? rs).
Em outra banda com formação 100% feminina éramos bem unidas e parceiras de outras bandas femininas locais. Não lembro de ter ouvido algum comentário machista enquanto toquei com esta banda. Por incrível que pareça a maioria do nosso público era feminino. Porém alguns rapazes que cuidavam do som conversavam conosco como se não entendêssemos nada sobre os nossos instrumentos musicais. Isso também ocorria com alguns luthiers.
Na minha opinião, no Rio de Janeiro o cenário é diferente. O metal aqui é um clube bem fechado, onde geralmente quem vem de fora não é muito bem-vindo. As bandas dificilmente se interagem. Das críticas que recebi nesta cidade por tocar guitarra em banda vieram de mulheres que não sabem diferenciar um baixo de uma guitarra.
Com relação a Hexwyfe, já fomos "deixadas na mão" por uma produtora mulher em um evento dedicado as mulheres. Também tentei contato com algumas integrantes femininas de bandas cariocas via facebook e comecei a seguir as bandas femininas no Instagram, pouca gente correspondeu.

2112. Tento imaginar o que mulheres como Suzi Quatro, Rita Lee, Lita Ford, Patti Smith, Grace Slick, Tibet, Joan Jett, Janis Joplin ou bandas como The Runaways, Mercenárias, Girlschool, Vixen, Volkanas... não sofreram para provar seu talento seja como band leadder ou como instrumentistas, não é? 

Mili. Ainda sofremos aquela discriminação que “mulher não sabe tocar” ou “toda banda de mulher é ruim”. Infelizmente este preconceito vem de homens e mulheres.

Debs. Todas essas bandas e artistas sofreram demais e o pior é constatar que ainda hoje em dia, temos que passar por episódios tão graves quanto esses que nossas antecessoras passaram. 

2112. Hoje o cenário está mais aberto levando em conta a quantidade de mulheres em bandas dos mais variados segmentos musicais. Isso é uma grande vitória... mas o que ainda falta para vocês conquistarem?

Mili. As mulheres estão fazendo um bom trabalho e ganhando o destaque merecido. Porém acho que falta derrubar o preconceito e o machismo que ainda existe na sociedade brasileira.

Debs. Falta o respeito, não adianta, principalmente no rock muitos homens não respeitam as mulheres, seja como musicista, seja como seres humanos independentes da questão de gênero.

2112. Nos shows vocês ouvem aquelas tradicionais piadinhas do tipo: "gostosa", "a nora que a minha mãe sempre pediu", assovios etc. Como vocês lidam com isso?

Mili. Em Curitiba eu levava cantada quando subia no palco, mas naquela época eu estava na casa dos vinte anos e era solteira, rs. Aqui no Rio só ouvi assobios. Porém acho que as cantadas são muito regionais. Já morei em algumas cidades do Brasil e percebi que no sul os homens costumam cantar mais as mulheres.
Com relação a lidar com cantadas, geralmente entra por um ouvido e sai pelo outro. Se a mensagem for engraçada, dou risada.

2112. A HexWyfe tem uma pegada metal com influências do rock progressivo. Como vocês trabalham essas influências para que o resultado final não soe apenas mais uma fusão de dois ritmos?

Mili. Uma das nossas autorais, a "Betrayed" está com uma pegada progressiva e talvez a “Final Hour” também se encaixe nesta definição. A música "Double Life" é um metal mais lento e arrastado que foge da definição do progressivo. Não sou especialista em catalogar estilos, mas é o que me parece.
Os riffs e ritmos são trabalhados e mesclados de forma harmônica, dando naturalidade a fusão estilos.

Debs. As diferentes formações musicais de cada integrante ajudam muito. Todas são muito ecléticas musicalmente, porem nosso som tem um norte que é essa pegada do metal trabalhado e não cuspido.

2112. Aproveitando o momento quais bandas mais influenciam o trabalho de vocês? 

Mili. As bandas que mais me influenciaram são Nevermore, Fear Factory, Pantera, Death, Control Denied, Megadeth, Pain of Salvation, Rush, Arch Enemy, Slayer, entre outras bandas que não irei nomear aqui se não a lista fica imensa!

Debs. Girlschool, Leather Leone, Heart dentre outras.

2112. Num cenário cada mais competitivo uma banda precisa deixar sua marca senão se tornar "mais uma" entre tantas. O que torna a HexWyfe diferente entre tantas outras bandas?

Mili. Para a banda não se tornar mais uma é preciso ter autenticidade no som. Vejo algumas bandas que simplesmente copiam o estilo e o “jeitão” dos riffs de bandas famosas, na esperança de ir na cola da receitinha que já deu certo. Nós trabalhamos na identidade do nosso som, mesclando as influências de cada integrante de forma harmoniosa. Também procuramos fazer shows diferenciados com performances de palco e convidados especiais, sempre buscando surpreender o público.

Debs. Acho que não apenas a questão de haver somente mulheres dentre as integrantes como também a peculiaridade do som e obviamente o discurso (e a pratica!) do empoderamento feminino.

2112. A set list dos shows de vocês sempre mesclam material autoral com releituras de clássicos do rock. Não seria mais interessante trabalhar apenas o material de vocês?  

Mili. Hoje em dia dificilmente as pessoas saem para ver bandas do underground que tenham o repertório 100% autoral. O público sempre pede uma cover. Por isso mesclamos o repertório de autoral e cover. Bandas como Sepultura, Fear Factory, Motörhead e Nigthwish já inseriram ou até gravaram músicas covers em seus discos. Porém algumas covers são versões metal de Lady Gaga e Naiara Azevedo.

Debs. A nossa tendência realmente é caminhar para o autoral, no entanto, nossas releituras são também uma forma de demonstrar nossa capacidade como arranjadoras além de compositoras.

2112. Quem compõem na banda?

Debs. Todas compõe, é um processo absolutamente coletivo.

2112. Recentemente entrevistei a banda Flores do Fogo que disse não escrever letras com conteúdos violentos. E vocês? O que mais as influenciam na hora de compor?

Debs. No nosso caso acho que é ao contrário, temos exatamente que denunciar essa violência de todas as formas as quais as mulheres estão constantemente expostas.

2112. A banda já tem uma música gravada. Vocês tem planos de lançar um single ou pretendem lançar um álbum completo? 

Debs. A tendência hoje em dia é lançar uma música de cada vez, isso é bom pois não há a pressão de sair correndo fazendo um álbum de qualquer jeito.

2112. Nos anos 80 a cena metálica carioca era bem mais comentada e atuante. Hoje quase nada se houve falar sobre novas bandas, novos álbuns, shows... O que houve? 

Debs. O que acontece é que a música virou um produto. Atualmente na musicologia inclusive existe uma categoria que se chama música de entretenimento por ser absolutamente vazia de tudo, seja de musicalidade ou de conteúdo das letras. Nesse cenário, principalmente no Brasil que não tem uma tradição “rockeira”, o Rio que já foi um expoente, hoje foi soterrado por uma visão carnavalesca da cidade.

Mili. Não acompanhei a cena carioca nas décadas anteriores, mas conheci bandas famosas do cenário como Dorsal Atlântica e Gangrena Gasosa. O metal não é valorizado no Rio de Janeiro como o Samba, Funk e Sertanejo. Se você topar qualquer show pode sair no prejuízo pois a lotação de uma casa pequena, dividindo uma bilheteria barata com a casa de show e produtor, não paga nem as custas do transporte da banda. Existem ainda os convites para tocar de graça com a desculpa ˜Temos as despesas de energia elétrica, aluguel de equipamentos e funcionários, infelizmente não temos dinheiro para pagar a banda mas cedemos o espaço”.
São poucos os locais cientes que as bandas também tem suas despesas, como ensaios, manutenção de equipamentos, transporte e alimentação, sem contar que músico também tem contas a pagar. Acho que este é um dos fatores que desanimam os músicos a ter banda de metal aqui no Rio. Porque são poucas as casas de show que pagam um cachê justo para as bandas. Sendo assim, é necessário ter um emprego paralelo pra manter a banda, porque viver só de música é praticamente impossível. A banda vira um gasto extra no orçamento. O dinheiro vindo dos shows nunca é suficiente para pagar o básico para manter a banda, como horas de ensaio, transporte e manutenção de equipamentos. Se o músico é obrigado a ter um emprego paralelo para se manter, ele não tem mais a dedicação exclusiva com a música. Isto diminui muito as chances deste músico se aprimorar a ponto de ser virtuoso. É claro que existem os músicos que optam a viver de música dando aulas de música além de terem suas bandas. Mas a gente percebe que é um caminho bem instável financeiramente para aqueles que não são bem famosos.
Além disso a cena metal no Rio de Janeiro está fraca. Quando é anunciada a turnê de uma banda grande de metal internacional no Brasil, a banda faz shows em Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e até em Manaus, mas dificilmente passa pelo Rio de Janeiro. Só o Rock In Rio que se sustenta. Os produtores menores estão desistindo de trazer bandas de metal internacional para o Rio de Janeiro porque não tem público suficiente que pague os custos básicos do show.
Já o sertanejo, funk e samba, são estilos em alta no Rio de Janeiro e tem melhor retorno financeiro. Quem vive da música com certeza vai correr atrás do que é mais lucrativo e deixar aquilo que não dá retorno em segundo plano. Mas com a crise, está difícil para todo mundo. Conheço músicos que tocam com grandes artistas brasileiros que antes da crise faziam em média 20 shows por mês e agora fazem apenas um show por mês. O Sepultura que é a maior banda de metal do Brasil, atualmente está fechando shows pelo Sesc. Eu considero o cachê do Sesc relativamente baixo para pagar uma banda deste porte. Não está fácil pra ninguém.

2112. Que bandas do cenário metal carioca você indicaria com um trabalho interessante?

Mili. Organic Reaction, Alex Martinho (instrumental), Lost Forever.

Debs. Blastfemme e Pornograma.

2112. Você poderia deixar o telefone ou e-mail para quem quiser contratar a banda?

Mili. Email da banda hexwyfe@gmail.com, contatos para shows (21) 99918-4456

2112. ... o microfone é de vocês!

Mili e Debs. Muito obrigada pela oportunidade de conceder esta entrevista ao seu blog. E agradecemos imensamente o apoio a banda.

 Próxima entrevista: Kim Kehl & Ricardo "Índio" Cardoso, dia 17

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