O blog 2112 foi formado com intenção de divulgar as bandas clássicas de rock, prog, hard, jazz, punk, pop, heavy, reggae, eletrônico, country, folk, funk, blues, alternativo, ou seja o rock verdadeiro que embalou e ainda embala toda uma geração de aficcionados. Vários sons... uma só tribo!



quarta-feira, 23 de junho de 2021

Entrevista Fábio Caramuru

Dois grandes músicos se encontram, montam o Duo Caramuru/Baldanza e lançam por um selo americano o belo Bossa In The Shadows. E apesar do nome o álbum vai muito além do conceito desse conhecido estilo musical. Infelizmente não foi lançado em terras brazillis mas vale uma procurada na net.  

2112. Vamos começar com você falando um pouco sobre a sua carreira. 

Fábio. Tive uma formação tradicional clássica, estudando muito piano para concursos, tocando solo e com orquestras. Ganhei muitos prêmios, uma bolsa para estudar na França com a grande pianista Magda Tagliaferro em 1980/81. Depois, pouco a pouco, fui descobrindo minha própria linguagem, tocando música brasileira, Tom Jobim até chegar no autoral.

2112. Entre os muitos músicos que você conhece e ouve quais te influenciaram na decisão de ser músico?

Fabio. Os grandes pianistas Magda Tagliaferro e Vladimir Horowitz

2112. Quais álbuns você destacaria como sendo essenciais na sua formação musical? 

Fábio. Sem dúvida, tudo do Vladimir Horowitz e tudo da Martha Argerich, além da audição das músicas do Tom Jobim e dos Ponteios do Camargo Guarnieri por Isabel Mourão.

2112. Você é de ficar pesquisando bandas em lojas ou na internet? Quem na sua opinião tem feito um trabalho digno de nota. 

Fábio. Tenho grande admiração pelo trabalho da Bjork, pois ela é sempre criativa, inovadora e tem uma linguagem musical bem marcante.

2112. A nossa cena apesar de pouco valorizada aqui em terras brazillis tem conseguido uma boa recepção no exterior com lançamento de álbuns e shows. Qual a sua opinião acerca disso?

Fábio. O brasileiro é colonizado por excelência, tende a valorizar os modelos importados do chamado primeiro mundo e não se dá conta do próprio valor. Nossa música é uma da mais ricas do mundo.

2112. Como você e Pedro Baldanza se conheceram e como surgiu a idéia de gravação do álbum Bossa In The Shadows?

Fábio. Fomos apresentados pela amiga em comum Maria Alice Haidar e logo nos identificamos. Ele propiciou uma enorme abertura em meu processo pessoal de libertação das amaras eruditas. Com Pedrão voei alto como nunca em sessões de improvisação extremamente ricas e prazeirozas. O álbum foi o registro de uma dessas sessões. O produtor alemão Heiner Stadler nos auxiliou a concretizar a idéia e o CD foi lançado em Nova York. São diversas improvisações livres sobre temas relacionados ao Brasil.

2112. O álbum foi gravado em São Paulo mas saiu pelo selo americano Labor. Como surgiu o contato entre vocês para esse projeto? 

Fábio. O Heiner me foi apresentado pela pianista (recém falecida) Beatriz Roman, que morava em Nova York. Fui até lá, toquei para ele, conversamos e fechamos o projeto.

2112. Até aonde eu sei o álbum foi lançado apenas em solo americano. Havia projeto de lançá-lo no resto do mundo? 

Fábio. Heiner faleceu há algum tempo. Tínhamos idéia de lançar na Europa, mas não aconteceu. É um trabalho muito ousado e provavelmente teria que ser divulgado entre setores bastante especializados. Aqui no Brasil, apresentei a um jornalista crítico musical relativamente famoso, para nos ajudar a divulgar, escrever na imprensa, mas fomos terrivelmente esnobados, uma pena...

2112. Fabio fale sobre o processo de gestação desde a sua pré-produção, criação das músicas, arranjos e a entrada no estúdio. 

Fábio. Costumo brincar muito antes, fico um período livre no piano, somente brincando, fazendo anotações, gravando caseiramente. Pouco a pouco, vou cristalizando formas e, quando me sinto pronto, vou para o estúdio.

2112. Quais as melhores lembranças que você guarda das gravações?

Fábio. Da liberdade de tocar sem amarras e aferir o resultado gratificante das aventuras pelo teclado. Acho mais difícil tocar para o microfone do que tocar na Sala São Paulo, por exemplo. É muita responsabilidade!

2112. De quem foi a idéia de regravar Afro-Samba de Baden Powell? Ela é um composição emblemática...

Fábio. Eu gostava muito de brincar com a tonalidade de mi menor, ela é confortável no piano. A ideia do Afro-Samba surgiu espontaneamente e criou corpo. Era um de nossos grandes cavalos de batalha. Improvisávamos muito sobre esse tema, sempre utilizando trêmulos, tanto no baixo quanto no piano.

2112. Cauting In Flight teve duas versões incluídas no álbum. Ficou mais algum material de fora?

Fábio. Sim, ficou muita coisa de fora, pois no momento de selecionar achamos que seria mais interessante colocar música com formas mais definidas, para não assustar demais o ouvinte... hehe

2112. Bossa In The Shadows apesar de ser um ótimo álbum é pouco conhecido por aqui. Até mesmo fãs mais roxos do Som Nosso de Cada Dia desconhecia a existência dele. Eu o descobri por um acaso na internet e não pensei duas vezes...

Fábio. Muito difícil divulgar, o público em geral prefere ficar no território conhecido. Veja a decepção que eu tive com um supostamente grande crítico... Ter que ficar explicando é complicado... Por outro lado, tivemos boas surpresas, principalmente vinda de pessoas “não especializadas”, que acharam demais o som!

2112. Estamos diante de uma raridade? 

Fábio. Sem dúvida, me orgulho disso e espero um dia conseguir fazer chegar esse álbum a um público mais expressivo. Com a partida do Pedrão estou bem triste ainda, mas em algum momento vou inventar algo para divulgar mais esse trabalho único.

2112. O álbum é ótimo para ouvir dirigindo, fazer caminhada, andar de bike num final de tarde ou tomando um bom vinho. Simplesmente maravilhoso!

Fábio. É um som inesperado, não?

2112. Vocês chegaram a fazer shows no exterior ou mesmo no Brasil para promover o disco?

Fábio. Não tivemos essa chance.

2112. O álbum foi lançado em 2007 e em 2019 Baldanza veio a falecer. Vocês tinham projetos de gravar uma sequência Bossa In The Shadows?

Fábio. Ficamos afastados nos últimos anos, mas eu, pelo menos, teria adorado prosseguir com a ideia.

2112. Falando da sua carreira: você participa de bandas ou segue carreira solo? Além de Bossa In The Shadows você tem outros álbuns lançados?

Fábio. Sim, tenho meu trabalho solo que hoje está concentrado em 2 direções principais: Projeto EcoMúsica e Tom Jobim. São esses os álbuns e singles:

1.   Tom Jobim Piano Solo - 14 faixas (1997 - MC 003)

2.   Especiarias do Piano Paulista - 25 obras de Inah Sandoval e Camargo Guarnieri (1999 - ECHO 199)

3.   Dó Ré Mi Fon Fon – 27 Cantigas Brasileiras - CD infantil educativo do pianista Fábio Caramuru criado em parceria com a artista multimídia Beth Bento. Lançado em 2002, o trabalho traz arranjos inéditos de Fábio Caramuru para piano de 27 cantigas brasileiras, tais como "Sapo Jururu", "Samba Lelê", "A Barata", "O Cravo brigou com a Rosa", entre outros. Beth Bento idealizou o "sound design" com sons da natureza, de animais, vozes e ruídos, bem como os 27 ícones relativos às cantigas, materializados em um jogo da memória.

4.   Moods Reflections Moods (2004 - ECHO 204) - Primeiro CD autoral do pianista Fábio Caramuru, lançado em 2004 pela Echo. Nesse CD com 10 faixas, Fábio Caramuru rompe com a tradição da interpretação erudita, voltando-se para um trabalho de livre improvisação. A gravação foi feita em uma única sessão em um piano Steinway, modelo D-Concerto, alcançando um alto nível técnico. O CD marca o início do aprofundamento do estilo pessoal do pianista, lançando-o como compositor. O desdobramento desse estilo pessoal de Caramuru pode ser ouvido no CD Bossa in the Shadows, gravado em duo com o contrabaixista Pedro Baldanza, e lançado em 2007 nos EUA.

5.   Canções de Richard Rodgers, com a cantora Magda Painno (2004 - ECHO 104)

6.   Piano: Tom Jobim por Fábio Caramuru - álbum duplo com 28 faixas (2007 - MCD 344)

7.   Bossa in the Shadows - autoral com o baixista Pedro Baldanza - 18 faixas (2007 - LAB 7083)

8.   Gustav Mahler - arr. Schoenberg - Das Lied von der Erde - participação como pianista no conjunto instrumental (Algol 2009)

9.   EcoMúsica | Conversas de um piano com a fauna brasileira - 14 faixas (2015 - Echo115)

10. EcoMúsica | Dialogues between a piano and the Brazilian fauna - 14 faixas (2016 - Flau Japan 60)

11. Tom Jobim by Fábio Caramuru - duplo, 28 faixas (2017 - Flau Japan 65)

12. Dó Ré Mi Fon Fon (2017, Flau Japan, 66)

13. EcoMúsica | Aves (2018, Flau Japan)

14. EcoMúsica | Harpia (2018), Single, Tratore

Tenho também um duo de pianos fantástico com Marco Bernardo, só fazemos música brasileira. O duo se chama Brasil em Dois Pianos

2112. Quais são seus projetos pós-pandemia?

Fábio. Planejo fazer mais e mais vídeos na natureza, dentro do Projeto EcoMúsica. No ano passado fiz Amazônia Uirapuru, este ano farei Mata Atlântica, no litoral de Ubatuba. Quero viajar, sair um pouco do país, tocar no Japão, em Portugal, no Canadá, pois isso me faz muito bem.

2112. Qual o seu e-mail/telefone para contratação de shows e aquisição de material de merchandising?

Fábio. flcaramuru@uol.com.br ou  (11) 99174 9123

2112. ... o microfone é seu!

Fábio. Muito obrigado por essa oportunidade de falar um pouco aqui!

 

01. Afro-Samba
02. Choro 2007
03. Caught In Flight
04. Ballad
05. Bossa In The Shadows
06. Take The Z Train
07. In Walked Tom
08. Baroque
09. Dancing The Baião
10. For Inezita
11. Guarniere Desconstructed
12. Mood 2004
13. Caught In Flight, Take 2
14. Incisive
15. String Theory
16. On Edge
17. Heartbeat, Tango & Waltz
18. Gestrual

Recorded: September 6, 7 and 8, 2006, at Theater Espaço Promon, São Paulo

Recording/Mixing Engineer: José "Gato" Luís Costa / Estúdio Gato
Executive Producer: Heiner Stadler

Potography: Otavio Dias
Design: Emil Kojuharov
Produced: Fábio Caramuru

All compositions: Fábio Caramuru & Pedro Baldanza
Published: Southern Pines Music Publishing Co. (BMI)

Canal Fábio Caramuru:
https://m.youtube.com/channel/UCFBnD7VHLG5dMRpRtQlJYFQ

Dedico esta entrevista a memória do grande Pedro Baldanza

 

quarta-feira, 16 de junho de 2021

Entrevista Carlos Coppos (Peso)

 

A banda Peso durou pouco tempo, o suficiente para gravar um único álbum e entrar para a história do rock brasileiro como uma das bandas mais viscerais ao vivo. Quem conhece o clássico Em Busca do Tempo Perdido e assistiu aos seus shows sabe do que estou falando. Conversei com o baixista Carlos Coppos que revelou informações bem interessantes.   

2112. Como foi que você conheceu o pessoal do Peso?

Carlos. Já conhecia o Geraldo D'Árbilly e o Constant. Toquei muito tempo com o Zé’ da Gaita que fez uma participação na gaita (harmônica) no vinil da Banda. Eu e Geraldo tocávamos na Banda Euforia, com o Raymond Piper, um cantor americano. Fomos trabalhar no Dancin” Days do Shopping da Gávea, acompanhando as Frenéticas. Ficamos lá por uns dois ou três meses, quando o Luiz Carlos contatou o Geraldo pra refazer o Peso. Daí saíram do Euforia, Geraldo, eu e o Leca. Chamamos o Mario Cabralia e o Serginho, teclados e guitarra respectivamente e formamos o Peso.

2112. Você assistiu a apresentação da banda no VII Festival Internacional da Canção defendendo a música O Pente? Se lembra da reação do público?

Carlos. Sim, mas não lembro direito da reação do público.

2112. Engraçado é que a temática da letra O Pente passou totalmente despercebida da censura: "Sem dar bandeira nem bobeira, bem tranquilo, eu fumei meu plá / E disse, pente, pente, pente/ Pra poder fechar." Isso apenas prova que não havia uma coerência de quem as analisava, não é?

Carlos. Na verdade, a ditadura militar não estava muito interessada nas bandas de rock, pois nos consideravam um bando de malucos e as letras praticamente não tinham cunho político, como na MPB, então não nos perturbavam.

2112. Luiz Carlos tinha uma presença incrível de palco além do seu vozeirão rouco. Acredito que tanto ele como o próprio Peso foram injustiçados na história do rock brasileiro.

Carlos. Não creio que injustiçados, porém naquela época a mídia pouco divulgava rock no Brasil, era um lance muito underground e a banda muito recatada, como o Luiz, meio avessos a sucesso, mas no palco nos transformávamos e fazíamos apresentações excelentes.

2112. Se formos falar de bandas, vocalistas e músicos "made in brazuca" injustiçados teremos uma lista bem longa, não é?

Carlos. Pois é, não sei se é isso, injustiçados, mas tinham bandas muito boas que não aconteceram. Como disse o rock era muito underground naquela época. Pouca mídia.

2112. A apresentação da banda no Hollywood Rock foi tão fulgurante como um cometa em rota de colisão e foi sem sombras de dúvida a melhor performance do festival. Rock’n’roll no talo...

Carlos. Foi muito boa realmente. Mas tiveram outras também muito boas, como as que fizemos no MAM e no Magnatas, por exemplo.

2112. Esses vídeos talvez sejam os únicos registros existentes da banda ao vivo, não é?

Carlos. Sim, tenho fotos, mas vídeo não.

2112. Na época foi lançado um álbum com registros do festival mas que segundo especialistas tratava-se de um embuste contendo gravações de estúdio com acréscimo de aplausos. Você sabe me informar se essa informação tem respaldo?

Carlos. Não tocava na banda na época, pois entrei depois do festival, e não posso afirmar.

2112. Em que ano você entrou para a banda?

Carlos. Meados de 1976.

2112. O álbum Em Busca do Tempo Perdido é simplesmente genial uma obra prima do rock'n'roll que se gravado em inglês teria tido outro rumo.

Carlos. Com certeza, muito bom mesmo, pra época.

2112. O Peso praticamente inaugurou a vertente do rock pesado no Brasil. Não havia bandas como eles e o interessante é que a cada dia que passa o álbum é mais e mais cultuado...

Carlos. A diferença era o som realmente pesado que fazíamos e a voz do Luiz que era especial. As composições e arranjos também muito bons. Ensaiávamos muito.

2112. Apesar dos shows sempre ovacionados a vendagem não teve o resultado esperado. Você acha que isso de uma certa maneira minou o futuro da banda?

Carlos. Não, pode ter contribuído, mas foram vários outros motivos.

2112. O envolvimento da banda com drogas também ajudou a acelerar o fim da banda, não é?

Carlos. Não creio. Tiveram vários motivos que levaram ao fim da banda no seu auge.

2112. A última notícia que tive é que o Luiz estava em Pernambuco sob os cuidados do seu filho. Isso procede?

Carlos. Sim, ele mora com o filho. Tenho notícias sempre.

2112. Mesmo com a saída de alguns integrantes a banda se manteve unida por um tempo. Havia projetos de gravar um novo álbum?

Carlos. Haviam vários projetos, mas de gravar imediatamente, não.

2112. Você ainda mantém contato com os ex-integrantes da banda?

Carlos. Não, da minha época só tenho conhecimento do Geraldo e do Luiz Carlos, os outros perdi o contato. O Leca e o Mario Cabralia já faleceram.

2112. Em algum momento a banda tentou retomar a carreira para shows e gravações?

Carlos. Depois que acabou, fizemos um show A Volta do Peso, no Circo Voador, com o Luiz, eu, o Charles Chalegre na batera, Zé Flavio na guitarra e Julinho Villani no teclado. Casa cheia, foi filmado, mas não encontro esse vídeo feito em VHS. O Jamari Franca elogiou muito na coluna dele.

2112. Soube que em breve será lançado um documentário sobre a banda. Você participou dele?

Carlos. Não, e não conheço ninguém que tenha visto ou participado. Usaram uma foto nossa, tentei contato com eles, em vão…

2112. ... o microfone é seu!

Carlos. O Peso foi sem dúvida uma das maiores bandas de rock do Brasil. Toquei na segunda formação da banda, a mais longa de todas, e tínhamos uma legião de seguidores e fãs. O show do Cine Bruni em Copacabana também foi antológico, mas o do MAM superou todas as expectativas de público. O Magnatas também, foram sucessos absolutos. Lancei um livro com minha biografia “MINHA VIDA ON THE ROCKS" (nome da banda que toco e produzo há muitos anos, especializada em festas e eventos com 4 cds gravados) com muitas histórias das inúmeras bandas que toquei e o PESO não poderia ficar de fora. Falo do rock no Rio de Janeiro nos anos 60 e 70, esquecidos em todas as biografias do rock que li, que só retratam a partir dos anos 80. Nos anos 70, tinham vários clubes com shows de rock no Rio. Além das famosas domingueiras no Monte Líbano, Caiçaras, Boliche de Copacabana, os Clubes Radar, Olympico, etc. Muita história nunca contada.


Obs.: Não consegui identificar os nomes dos autores das fotos. Qualquer informação envie para o meu e-mail (furia2112@gmail.com) que eu possa dar os devidos créditos.