Na década de oitenta muitos deram o prog como um
estilo morto. Mas os verdadeiros fãs nunca aceitaram esse veredito e como
verdadeiras formiguinhas mantiveram o estilo vivo e atuante. Nesse meio tempo o
cenário viu nascer várias bandas maravilhosas como a Tempus Fugit. E nessa
entrevista com Ary Moura (bateria) & André Mello (teclados e voz) conta um
pouco da sua trajetória e os planos para o futuro.
2112. Este ano a Tempus Fugit comemora 27
anos de estrada. Qual o balanço que vocês fazem desse tempo e quais os projetos
para o futuro?
Ary Moura. Bem, se chegamos até aqui, é porque
tivemos o apoio do grande público de Rock e de ProgRock, e queremos agradecer a
todos vocês por essa conquista e apoio. Atualmente estamos em processo de
ensaios visando as próximas apresentações ao vivo já que ano passado nem
tivemos essa oportunidade infelizmente, mas estamos trabalhando duro para que
novas conquistas venham a se realizar, a banda continua com força total, vem
chumbo grosso aí, podem aguardar!!
André Mello. Nossa... É muita coisa... Uma montanha russa de emoções... conquistas...
fracassos, etc... viajar aos EUA sem dúvida foi a maior conquista. Ser
respeitado e até admirado por músicos de uma banda como Kenso, no Progfest
2000... conversar com fãs americanos... mexicanos...e japoneses. Tocar em
Buenos Aires foi sensacional também. Fomos tratados de forma excepcional pelos
argentinos. Por outro lado, as várias baixas de integrantes na banda, idas e vindas
de componentes... dificuldades do mercado brasileiro...falta de patrocínio,
etc. Isso fez com que nossa discografia não estivesse compatível com tantos
anos de estrada...gostaria de estar já no quinto CD, no mínimo...de ter um DVD
descentemente gravado, por exemplo. Mas a vida é assim... e não desistimos.
Vamos em frente!
2112. Acompanho o trabalho de vocês pelas
redes sociais e vejo o quanto as pessoas admiram o trabalho da banda. Os fãs do
rock progressivo são como membros de uma sociedade secreta que divulga suas
bandas no calado sem fazer muito alarde, não é?
André Mello. Sim... uma legião silenciosa que adora esse tipo de música. E que felizmente
muito tem nos ajudado a espalhar o nosso som pelo mundo.
2112. Mesmo quando o progressivo foi dado
como “morto” pela mídia os fãs se mantiveram unidos dando força para as bandas
comprando seus cds, frequentando seus shows... Isso é que é fidelidade!
Ary Moura. Sim, perfeitamente, o que nos mantém
vivos e em plena atividade são os fãs, sejam do Brasil ou exterior, ainda que
em pequena escala mas mesmo assim temos o nosso público ainda fiel!
2112. É incrivel a quantidade de
comunidades, blogs e sites dedicados ao movimento e bandas na Internet. Isso
sem contar o mercado negro de vinis raros vendidos a peso de ouro...
Ary Moura. os Blogs, Vlogs, canais streaming,
spotify, youtube, etc.. tem que continuar para que se mantenha a chama acesa.
Quem sabe no futuro ainda não lançaremos nossos trabalhos em vinil, não podemos
descartar nenhum tipo de mídia nesse momento tão estéril para música de um modo
geral!
2112. Vocês têm uma trajetória respeitável
com quatro ótimos álbuns lançados, um DVD e fãs espalhados por todo o Brasil e
no exterior. O que ainda falta conquistar?
Ary Moura – Parece pouco mas queremos muito mais,
queremos estender nossa discografia o quanto antes, somos livres para compor,
arranjar, criar, sempre buscamos coisas novas, novos desafios, quebrar
barreiras, nos reinventar, enfim, nos superar. Hoje o trabalho está
praticamente consolidado com essa formação atual, tivemos algumas dificuldades
no passado para cobrirmos a ausência de alguns integrantes mas agora temos um
time extremamente competente e queremos ainda, retornar para palcos no exterior
e conquistar ainda mais fãs da nova geração do Progressivo.
André Mello. Eu gostaria de tocar em outros estados... Por enquanto só fomos a
Minas Gerais. E claro no exterior também. Vejo festivais por aí pelo mundo em
que teríamos capacidade de representar bem o Brasil novamente. Ter um bom
material em vídeo também é importante. Felizmente em 2018 isso começou a
se tornar realidade com a ajuda de muita gente interessada na nossa música. Já
temos um novo canal no Youtube (https://www.youtube.com/channel/UCMzp0PnwYC2G2BcKTPRT4cg) com alguns vídeos em HD, som direto da mesa mixado e
multicameras, do show de 25 anos.
2112. Em 1996 vocês lançaram uma demo
que além de uma ótima aceitação deu a banda o título de “revelação brasileira”.
Vocês se surpreenderam com os resultados?
Ary Moura. Foi na época do Rio Art Rock 96 com
shows de bandas como Solaris, Sagrado, Bacamarte e Minimum Vital no atual
Citybank Hall, tivemos a oportunidade de distribuir algumas cópias e em outro
evento chamado Carreta da Cultura na Cinelândia, um evento aberto ao público de
rua com 2 palcos armados no calçadão, resultado é que vendemos todas as nossas
cópias, foi algo surpreendente e animador.
André Mello. Aquela demo (que pode ser ouvida no canal https://soundcloud.com/amelloc/tracks) foi como gravar um ensaio para o primeiro cd. Ajudou bastante a
melhorar o resultado final, do que viria a ser nosso primeiro CD oficial.
2112. O sucesso da demo inclusive foi um dos
fatores decisivos para as gravações do primeiro álbum: Tales From a Forgotten
World. De um certo ponto de vista tudo aconteceu muito rápido, vocês não acham?
Ary Moura. Sim, o Alexandre Regino e o Paulo
Cesar da antiga loja PC Mellody resolveram entrar em contato e nos patrocinar
com a gravação do que seria primeiro CD oficial da banda. Isso nos deixou
totalmente focados para seguirmos nosso caminho e procurar fazer cada vez
melhor em trabalhos futuros.
André Mello. Sim... Exatamente... Acho que surgimos num momento de respiro no
mercado... Não havia novos lançamentos de bandas naquele ano. Hoje temos
muitas bandas, fomos talvez até os primeiros de uma leva de bandas que vieram
nos anos seguintes... 98, 99, 2000...Fizemos essa divulgação de panfletagem
como o Ary escreveu...de um show em Botafogo na casa LUGAR COMUM. E foi o
início de tudo.
2112. Esse trabalho projetou o nome da banda
no exterior a ponto de serem disputados por selos importantes como o Musea,
Mellow entre outros. O que mudou na história da banda desde então?
Ary Moura. Foi algo assim imensurável, ter uma
projeção além das nossas expectativas com gravadoras fora do país com o desejo
de nos lançar pro mercado Internacional, graças a Deus temos um selo
genuinamente brasileiro para nos manter ativos e focados e ainda temos muito
por fazer.
André Mello. Uma surpresa agradável eu diria. Um reconhecimento do empenho e da
qualidade das composições do primeiro álbum. Teríamos até tocado no BAJAPROG no
México em 1999... Mas a falta de estrutura da banda na época não nos
deixou participar desse festival.
2112. A primeira tiragem de 1000 copias
esgotou em questão de três meses e ficou no primeiro lugar no Garden Shed, uma
parada de música no Japão. Isso de uma certa maneira surpreendeu vocês?
André Mello. Sim...certamente. Éramos uma banda nova... sem muita experiência em
estúdio e tal...Mas acho que a qualidade das composições, impacto da arte
gráfica, boa divulgação mais o momento em foi lançado foram fatores que
impulsionaram o álbum chegar onde chegou.
2112. Em 1999 em comemoração aos dez anos da
banda o álbum foi relançado pelo selo Masque Records com o título “Tales From a
Forgotten World Extended & Remastered Edition” com a adição de duas faixas
bônus.
André Mello. Foi um belo "upgrade ", até mesmo na capa que já era uma
bela idéia. Tivemos duas faixas extras, com nossa primeira gravação em
estúdio das músicas "The Goblin's Trail" é "Princesa Vanessa"...
com somente eu e Henrique Simões da formação que gravou o álbum.
2112. Em quantos países vocês já se apresentaram
e como foi a acolhida?
Ary Moura. Tocamos no Buenos Aires Prog 99` como
banda principal e no Progfest 2000 na cidade de Los Angeles, Califórnia (USA),
onde fomos recebidos com extremo carinho desde a chegada no aeroporto quanto ao
Hotel e Teatro. Foi mágico ao saber que somos admirados e queridos por pessoas
de países que nem imaginávamos.
André Mello. Fomos convidados como disse para o Baja Prog no México. Mas não
conseguimos dinheiro pra viagem.
2112. Na minha opinião os brasileiros e os
italianos são os maiores e mais fiéis fãs do prog rock no mundo. Qual a opinião
de vocês?
Ary Moura. Não só o Italiano, mas acredito que o
público Japonês e o Alemão ainda consomem Rock Progressivo como poucos, ainda
que o Brasil não esteja longe disso.
2112. Entre 2000 e 2007 vocês passaram por
várias reformulações, mudanças na formação... Enfim, o que de fato aconteceu?
André Mello. Sim... período conturbado que atrasou muito o lançamento do álbum
Chessboard. Aconteceram problemas diversos... desde problemas com o selo Rock
Symphony, estúdio com problemas, componentes da banda saindo, novos entrando,
componentes voltando, etc... Chegamos até ter 2 guitarristas na banda por
um tempo. É até difícil contar tudo desse período cronologicamente sem erros rsrs
2112. É muito difícil encontrar músicos com
formação e que seja compromissado?
Ary Moura. Aqui no Brasil é tudo muito difícil em
se tratando de grandes músicos, que vias de regra, já tem seus compromissos com
outros artistas, assim, fazer parte de uma banda de Rock Progressivo torna-se
um desafio e uma grande dificuldade. Uma vez que amamos o que fazemos, porém
sempre encontramos um tempinho para nos reunir. Temos que nos dar esse direito.
2112. Me explica uma coisa, como surgiu a
idéia do lançamento do cd Official Bootleg 98-Feb? Como vocês tomaram
conhecimento da gravação?
André Mello. Outra estória complicada rsrs... fizemos um show no Flamengo que foi
gravado e filmado. Virou um cd bootleg... quando vimos já estava praticamente
pronto. Não gostamos do resultado, mas... paciência...a gravação é tosca, a
performance não foi das melhores. Ou seja, se dependesse de nós esse álbum não
existiria. Tanto é que uns 3 anos depois eu comprei os fonogramas e impedi que
houvesse uma nova prensagem desse cd.
2112. O material sofreu overdubs em estúdio
ou foi lançado mantendo tudo como foi gravado?
André Mello. É um autêntico bootleg nesse sentido... gravado direto da mesa (eu
acho rsrs), sem "overdubs"... sem mixagem...sem qualidade...não
recomendo rsrs
2112. Após um hiato de quase oito anos é
lançado Chessboard para o alivio dos fãs que ansiavam por uma nova gravação da
banda. Como foi o processo de criação e gravação do álbum?
Ary Moura. Poucos anos após o lançamento de “Dawn
After...” mais precisamente em 2001, iniciei minhas gravações de bateria, pois
queríamos lançar logo esse trabalho, estava de fato nos planos da banda, lançar
bem próximo de 99, porém sofremos com saída de integrantes, processos digitais
que quase foram corrompidos e perdidos na mesa de gravação dentre outros
fatores, mas ainda sim, conseguimos recuperar todo material e assinamos com a
Masque Records o que seria o nosso próximo disco. As composições já estavam bem
adiantadas e era só uma questão de tempo. Tempo esse que com muita dificuldade
e total dedicação conseguimos lançar com atrasos mas ainda sim, o trabalho
tinha que sair do forno. Em 2008 ele sai, porém, não queríamos mais esperar
para que se concretizasse oficialmente.
André Mello. Bem...o fato de termos todos esses anos entre 1999 e 2008 foi bom pois
foi possível lapidar as composições ao máximo. Tínhamos um estúdio
"próprio " a nossa disposição, então foi possível gravar e
regravar muita coisa...nos deu mais experiência de tirar o melhor de nós e dos
equipamentos. As músicas já vinham sendo tocadas em shows anos antes do cd sair,
o que também é bom pra testar a melhor forma da música.
2112. O que mais estimula vocês durante o
processo de composição?
Ary Moura. Só o fato de nos reunirmos para
trocarmos idéias, já é algo motivador e estimulante porque com músicos
excepcionais como estes ao meu lado é indescritível se pensar diferente e temos
sempre o que aprender um com o outro, hoje somos uma única peça.
André Mello. No meu caso...sou um compositor antes de ser tecladista e
principalmente vocalista rsrs. E as idéias que os outros músicos trazem para as
minhas composições são sempre bem vindas, só as valorizam. De fato uma
das nossas características é trabalharmos para música, não há estrelismo
entre nós. É puro amor a música.
2112. Que tal conversarmos um pouco sobre as
gravações do quarto álbum? Como anda as gravações? Vocês já tem uma previsão de
lançamento?
Ary Moura. Ainda estamos curtindo um pouco desse
relançamento de “Dawn After Remaster...” mas já temos algumas composições
prontas e concisas em relação ao que será o próximo trabalho de inéditas,
estamos ávidos a iniciar tal processo. Hoje temos um time de primeira já
fechado, portanto queremos sempre mais, e com isso termos a certeza que ainda
podemos ir mais longe. A idéia inicial é começarmos a gravações já no mês de
Março ou Abril de 2019 e para um possível lançamento em 2020
André Mello. O que eu posso dizer é que estamos coesos e faremos o melhor possível.
A faixa extra "The last day" é nossa primeira gravação de estúdio em
10 anos e dá uma idéia da forma que estamos.
2112. O novo trabalho já tem um título
definido?
Ary Moura. Ainda é muito cedo para isso rsrs, mas
já se tem uma vaga idéia do que possa vir a ser.
André Mello. Tenho sim já um nome em mente. Mas ...é cedo pra revelar. Devemos
ter umas 5 ou 6 músicas no próximo álbum... O tamanho das músicas limita o
tempo. A maioria tem mais de 7...8 min.
2112. O que nós fãs da banda podemos esperar
deste novo trabalho? Dá para adiantar algum segredinho ou tudo está guardado a
sete chaves?
Ary Moura. O que eu posso adiantar é que este
será ainda melhor que os anteriores, pode ter certeza, podem me cobrar, temos
grandes músicos e boas idéias para não pararmos pelos próximos 100 anos.
André Mello. Eu sou mais contido que o Ary nesse caso. Grandes expectativas podem
gerar grandes decepções rsrs. De novo digo que daremos o melhor possível
de nós. Temos boas idéias e pouco tempo infelizmente, mas já temos tocado
2 músicas novas em shows nos últimos anos. Isso azeita a execução e evita perda
de tempo no estúdio quando chegar a hora de gravar. Estou feliz com o
material que temos pra trabalhar e triste com o que não vai entrar nesse
próximo. Adoro essa parte de criação, estúdio, arranjo, etc...
2112. De certa maneira o cenário prog está
bem mais forte e maduro que alguns anos atrás quando várias bandas incluíram
elementos da música pop na fórmula original do prog. Como vocês analisam este
período?
André Mello. Sim...o cenário está intenso. Existem muitas bandas hoje
em dia. É até difícil acompanhar tudo. Quando lançamos nosso primeiro CD
a cena nacional era uma avenida aberta. Hoje as pessoas gravam álbuns em casa
muito mais facilmente também. Temos bandas de todas as vertentes
progressivas...uma variedade excepcional.
2112. Acredito que a ausência das grandes
suítes, das experimentações em estúdio ou de elementos eruditos foi decorrente
da frieza do mercado o que levou muitas bandas tomarem medidas drásticas para
se manterem na ativas, não é?
Ary Moura. Nesse novo trabalho estamos fazendo o
que chamamos de pequenas suítes, e isso não vamos descartar de nossa
característica principal na nossa maneira de compor. Os desafios e as
dificuldades existem para serem superados e estamos prontos para isso.
2112. O Iron Maiden disse certa vez que eles
tem os melhores fãs do mundo. E vocês, o que dizem dos fãs da Tempus
Fugit?
Ary Moura. Os nossos melhores amigos pelo mundo,
nosso alicerce que ainda nos mantém vivos dentro do cenário ProgRock! Levamos
nossa música aos fãs e eles dão seu feedback, é uma troca de energia!!
André Mello. Fã é sempre muito bom... São aqueles que vibram com a música como
nós... Estão em sintonia com o que transmitimos e nos transmitem de volta a
força pra continuar. Só gratidão!!
2112. Uma curiosidade... O nome da banda é
uma homenagem ao Yes que tem uma música com esse título ou é mera coincidência
prog?
André Mello. É
minha banda preferida. E um nome que remete ao progressivo instantaneamente.
Yes, Eloy, Anyone's D., Genesis, Supertramp, essas são algumas das minhas
preferidas.
2112. ... o microfone é de vocês!
Ary Moura. Estou muito feliz em participar dessa
entrevista e agradecer a todos vocês pelo carinho e tempo disponível conosco.
Quero ressaltar que a Tempus Fugit quer alçar vôos ainda maiores, queremos
voltar aos palcos mundo afora, outros estados brasileiros e conquistar cada vez
mais o grande público, ainda temos muito o que realizar como músicos, sentimos
que não fizemos tudo aquilo que de fato gostaríamos, mas ainda assim queremos
ir mais longe e sermos cada vez melhores músicos.
André Mello. Obrigado
ao 2112 pela oportunidade e interesse na nossa música. Pela divulgação desse
estilo que tanto gostamos. Obrigado os fãs da Tempus Fugit, de coração. Estejam
certos estaremos trabalhando pra trazer um novo álbum e músicas novas a partir
de agora... Pois afinal... Tempus Fugit.
Próxima entrevista
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