quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Entrevista Ladies Instrumental Band



É muito interessante quando encontramos num cenário infestado de bandas descartáveis talentos como a Ladies Instrumental Band. É jazz com sotaque brasileiro e tempero feminino o que resulta em shows animados e cheios de personalidade e que o Blog 2112 tem o orgulho de apresentar para vocês.      
2112. A início o que mais me chamou atenção foi a formação totalmente “feminina” da banda justamente por ser um formato pouco usual em se tratando de Brasil, não é?
Célia. Sim, é um diferencial ser uma banda feminina. No Brasil e no mundo as mulheres quando tocavam, não se atreviam na bateria, baixo guitarra... ficavam mais como pianistas e cantoras, não desmerecendo ninguém, mas era uma posição machista. Eu sofri muito com isso... não acreditava que eu poderia tocar baixo e tocar bem rsrs.
Dudáh. Concordo com você. O formato é realmente pouco usual no Brasil. E, deixando lá longe a modéstia, todas sabem transitar muito bem pela base e pelo improviso, coisa mais rara ainda. Faço vários arranjos para a banda e escrevo sem o menor receio, passagens difíceis para todos os instrumentos. Tenho confiança nas Ladies, sei que elas vão tocar lindamente! E deixo espaço todas improvisarem.
2112. Sempre houve a participação de cantoras e mesmo instrumentistas em várias bandas na história do rock e do jazz. Mas bandas 100% femininas são muito poucas... Ainda existe preconceitos em relação a isso?
Célia. Hoje em dia não sinto assim... como por exemplo nos anos 80, naquela época havia muito preconceito com a mulher em posição de igualdade. Hoje vejo que há uma onda, uma moda banda feminina. Acho que o preconceito foi muito mais forte, e hoje acho a mulherada bem ponderada.
Dudáh. Preconceitos? Acho que ainda existem, mas cada vez menos... Por parte dos homens mesmo! Sinto que muitos homens acham que não vai sai um som bom, assim que veem a gente entrar numa palco pela primeira vez. Ainda bem que mudam de idéia! Rsssssssss.... Por parte das mulheres, percebo um movimento crescente em relação ao posicionamento frente a esses preconceitos. Mais bandas femininas apareceram no Brasil. Mas é necessário trabalhar o comprometimento com o crescimento profissional enquanto coletivo (banda).  Claro que não falo de todas e nem incluo as Ladies nisso tudo. Falo num geral. Mas a união em uma banda é importante para o resultado perfeito. E isso, numa banda feminina, é essencial para que o preconceito machista seja realmente combatido. 
2112. Outra curiosidade é quanto ao grupo ser “instrumental” formato um tanto marginalizado por aqui visto que a mídia pouco ou nada noticia algo dentro do gênero. Qual é a reação do público nos shows? 
Célia. Olha, eu acho ótima a reação do público...como não se ouve em rádios ou tvs, quando o público tem a oportunidade, a reação sempre é positiva...várias vezes senti o público ávido por música de qualidade, a música instrumental no Brasil é rara, porém, o público brasileiro sente vontade de ouvir improvisos, solos e versões de temas clássicos.
Dudáh. O público tem reagido bem. Eles precisam ouvir para saber do que se trata, e quando ouvem, gostam!
2112. Tenho ouvido muita banda reclamar da falta de apoio, de espaços e do próprio público que às vezes paga para assistir a um show internacional mas reclama de pagar 10, 20, 30 reais num show das nossas bandas. O que vocês tem a dizer a esse respeito?
Célia. Isso é o reflexo da cultura americana dos anos 50. O que vem de fora é melhor do que está sendo produzido aqui dentro. Acho uma pena esse pensamento...temos compositores e músicos reconhecidos internacionalmente, e que aqui nem sabem de quem se trata. Eu acho também que o músico brasileiro deveria ser mais valorizado, e deveria se valorizar mais. Deveríamos ser um grupo (de músicos) mais unidos e nunca aceitarmos caches baixos, exigir da OMB nossos direitos, e tudo que envolve a parte dos compositores, acho tudo meio exploração no que diz respeito a ECAD, etc... Já me senti explorada, e vi amigos sendo também, ora por produtores, ora pelo sistema todo. Não há valorização. TEMOS QUE NOS UNIR.
Dudáh. Sim, isso acontece bastante. E concordo com a Célia, quando ela diz que a origem está na supervalorização do que vem de fora, em contraposição à pouca do que vem de dentro do Brasil, reflexo dos anos 50/60. E isso é tão forte que muitos músicos brasileiros demoram para se perceberem bons. E se desvalorizam aceitando cachês baixos e condições péssimas para trabalhar... outros não se aprofundam em estudos e estacionam, não crescem em suas carreiras... No fundo é uma outra forma de se desvalorizar... Infelizmente né? 

2112. Tá complicado manter uma banda “dignamente” na ativa em meio a toda essa crise que o país está enfrentando? É preciso matar um leão por dia, não?
Célia. Essa crise pegou todo mundo...e isso reflete nas artes, tem muita casa noturna que fechou, diminuído o número de palcos. Sinto também que não há muitas oportunidades pra bandas desconhecidas, que não estão na mídia. Existem grandes shows em estádios, porém aquele show mais intimista, que a gente fica perto do palco e curte o som, o musico, isso agora é raro é vintage.
Dudáh. A crise mais brava que já tivemos. Mas em épocas de crise, é que mais se sente a necessidade da união dentro de uma banda. Não há mesmo muitos espaços para bandas desconhecidas, mas sinto que, o que faz a diferença nessa hora é o trabalho constante para que apareçam shows. Bem ou mal, considerando a força dessa crise, até que conseguimos alguns bons resultados. Procurar por mais espaços, cavar shows, estudar muito e se esforçar para fazer uma música de qualidade e muito bem feita, tudo isso faz parte do trabalho de uma banda e gera resultados bons. Sinto que tem muita gente que se acomoda e chora sem se mexer muito......
2112. Vocês vivem exclusivamente de música ou precisam trabalhar para se manterem? 
Célia. As integrantes dão aulas e tem outros trabalhos.
Dudáh. Trabalho exclusivamente com música. Para se manter com música no Brasil o músico precisa sempre se empenhar para que seus trabalhos sejam bons. Eu, como pianista, toco em eventos de empresa, casamentos em igrejas e buffets, restaurantes com piano bar, faço trabalhos com gravação em estúdios, componho e executo música para cinema e para teatro, toco em corais, dou aulas de música em escolas e particulares.... É trabalho prá mais de metro! rsssss
2112. Como surgiu a Ladies Instrumental Band?
Célia. Bom, todas as bandas a Ladies Blues Band, Garotas da bossa e Ladies instrumental foram criadas por mim, todas são com mulheres, embora tenha tocado com outras bandas, com caras, as bandas femininas são uma marca no meu curriculo desde 1977. A Ladies Instrumental Band surgiu da vontade de improvisar muiiito e também da dificuldade de arrumar cantora que cantasse bem e em inglês. No instrumental me sinto livre, e posso me expressar musicalmente em plenitude, tenho liberdade de me expressar, de tocar o tema da música, de fazer escalas, correr o braço do meu baixo... não tenho limites impostos pelo acompanhamento apenas.
Dudáh. A Ladies Instrumental surgiu quando a Célia e eu recebemos um convite do mestre Izaías do Bandolim, para que gravássemos umas faixas na sua Coletânea de CD de choro. Já tínhamos a idéia de improvisar muito como a Célia falou. Mas esse convite ajudou a “ligar a chave” para montarmos nosso trabalho instrumental. 
2112. Incrível como vocês ainda mantém as bandas Ladies Blues Band e As Garotas da Bossa. Como é conciliar agendas, ensaios, escolha de repertório, shows... Deve ser uma grande loucura, não é?  
Célia. Não é não viu... porque as integrantes são praticamente as mesmas, e como sou eu quem faz a produção e venda de shows, concilio e também tenho na manga algumas substitutas a altura das integrantes, no mesmo nível musical.
Dudáh. A Célia disse tudo!!!!
2112. O repertório de vocês é basicamente constituído de releituras de clássicos da nossa música e da música americana. Vocês nunca pensaram em compor um material autoral?
Célia. Sim fazemos arranjos e releituras, temos uma peculiaridade na banda. Gostamos de decompor a função dos instrumentos, tipo assim: o baixo faz a melodia, o piano faz o baixo e o cavaco, a guitarra a cuíca... temos essa decodificação que gera um colorido e timbres diferenciados. Nossa criatividade está nos arranjos, nunca compusemos uma música.
Dudáh. Nos divertimos compondo arranjos criativos. Até temos uma componente que faz um trabalho autoral, mas não com a banda.
2112. Isso é muito bacana... Vocês já lançaram algum trabalho?
Célia. Na verdade não! Tudo o que temos é o vídeo do SESC Instrumental Brasil, e recentemente fotos do Festival do Banco do Brasil.
2112. Quais são os projetos da banda nesta área? Podemos esperar novidades?
Célia. Olha no momento, devido à crise financeira e econômica, infelizmente apenas shows.
Dudáh. Torcendo para que essa crise acabe! Não é mesmo?
2112. Quero agradecer a paciência de vocês em responder a todas as perguntas. O microfone é de vocês...
Célia. Eu que agradeço...Carlos é boa essa forma de divulgação. As pessoas hoje se encontram na net, é a melhor maneira de encontrar gente que curte música de qualidade.
Dudáh. Muito obrigada pelo espaço, Carlos. A música instrumental precisa de frentes como a sua para divulgação, achei o máximo! Parabéns pela iniciativa.
2112. Muitíssimo obrigado!!

Integrantes:
Célia Carvalho: Contrabaixo elétrico
Dudáh Lopes: Piano
Gabriela Gonzales: Guitarra
Caroline Campache: Bateria

Fotos: Leandro Almeida

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