terça-feira, 31 de outubro de 2023

Entrevista Marcos Cordeiro

2112. Há trinta anos você está "live on the road" com passagem por diversas bandas. Como você resumiria esse tempo de aprendizado na sua vida?

Marcos. Eu diria que foi um período muito gratificante, o sonho de ser músico, tocar guitarra e fazer parte de bandas é uma das melhores experiências que se pode ter, apesar das dificuldades em se fazer música no Brasil. Toquei em grupos de blues, rock, rockabilly, bandas covers e trabalhos autorais, eu diria que nas bandas covers eu aprendi, me diverti, e nos trabalhos autorais eu me desenvolvi, criar é realmente a experiência mais prazerosa. 

2112. ... o interessante é que ao tocar em diferentes segmentos musicais você amplia seus horizontes como músico, não é?

Marcos. Sim, sem dúvida, cada novo trabalho é um desafio e um aprendizado. Eu trabalhei com vários amigos compositores, caras da minha geração como meu amigo Fabio Ribeiro. Eu gosto dos trabalhos autorais porque você tem liberdade de criar, é como uma página em branco esperando pra ser preenchida. Gostava muito de fazer arranjos de guitarra e solos para essas novas composições, e esses amigos sempre reconheceram meu trabalho por isso.

2112. Eu tenho o blues como referência... mas adoro explorar sonoridades étnicas além do jazz, soul, hard, psicodelismo, prog, música experimental etc. E você?

Marcos. Acho que também sou assim, gosto de ouvir música em geral, música boa, como quando você vai ao cinema e é surpreendido com uma música linda, de alguém que você nunca ouviu falar. Agora minhas influências como músico já não são tão abrangentes, rock anos 60 e 70 principalmente, blues, rockabilly e um pouco de jazz, gosto também da turma mineira, do pessoal do Clube Da Esquina.  Minha formação como guitarrista vem por esse caminho.

2112. ... dos grupos que participou existe registros disponíveis nas plataformas digitais?

Marcos. Há um trabalho antigo, do final da década de 90 do grupo Aerosilva. Participamos de muitos programas de TV nessa época, tivemos contato com gente da mídia, porém o grupo acabou não atingindo o grande público. No Aerosilva fiz parte do segundo álbum da banda. Esse trabalho foi produzido por Mauricio Nunes e Alexandre Fontanetti. Agora recentemente foi lançado o EP do amigo Duck Strada, participo na guitarra em duas faixas. Entre esses trabalhos houveram outras gravações porém nada disso está disponível na rede.

2112. Nessas idas e vindas entre uma banda e outra como surgiu a idealização do álbum "De Minas A Bangkok"? Você já tinha esse material pronto?

Marcos. Aconteceu de uma forma bem curiosa, a princípio não planejada.

Ao longo do tempo eu sempre colecionei algumas composições, normalmente temas instrumentais, de vez em quando surgiam essas ideias, eu desenvolvia e deixava guardado, não ligava muito pra essas músicas.  Um dia ao encontrar um amigo, Edson Machado, ele me disse que estava há pouco tempo com um equipamento de gravação em seu apartamento, e me convidou pra fazer uns testes, umas experiências, ele me disse que queria aprender a gravar. Marcamos um dia e apareci por lá, sem expectativas. Nessa primeira sessão gravei uma música que tinha composto há pouco tempo, chamada Cry Baby, fiz duas guitarras base, alguns arranjos e um tema solo seguido de um improviso. Foi rápido mas fiz tudo direitinho, como se faz uma gravação oficial pra um disco. Ao ouvir a faixa ficamos impressionados com o resultado, mesmo sem baixo e batera a música parecia pronta, talvez porque fiz várias camadas de guitarra, parecia que não precisava de mais nada, nesse momento pensei: “uau, a música é boa!” Daí marcamos uma segunda sessão, empolgado com a experiência de ouvir minha música gravada compus um segundo tema no período entre o primeiro e o segundo encontro. Fizemos esse novo tema na segunda gravação, novamente fiz todas as camadas de guitarra, caprichei nos timbres, e ao ouvir o resultado no fim da sessão quase cai de costas, essa segunda música tinha ficado ainda melhor que a primeira, foi aí que eu vi que realmente eu compunha coisas interessantes, eu precisei ouvir gravado para ter essa percepção... Daí resolvemos gravar esse álbum, produzimos juntos, e as músicas das duas primeiras sessões de gravação estão no disco, uma delas é o tema de abertura, chama-se “A Dança dos Pássaros”.

2112. As composições são todas suas ou você divide parceria com amigos ou membros da banda?

Marcos. As músicas são minhas, exceto a faixa “A Bicicleta e o Catavento”, que compus junto a cantora Marcela Maia.

2112. Você poderia falar um pouco sobre as gravações do De Minas A Bangkok?

Marcos.
A primeira parte da gravação do disco foi toda no apartamento do Edson, ele tem vizinhos muito pacientes, tivemos tardes de trabalho muito agradáveis e divertidas, sou muito grato ao Edson por isso. Gravamos assim todas as guitarras, baixos também. Na segunda etapa do projeto fui para bons estúdios para fazer a bateria e mixar, acabei refazendo algumas guitarras também, sou muito perfeccionista, como bom virginiano.

2112.. ...além de você, do Nilson e do Felipe houve a participação de outros músicos em estúdio?

Marcos. Primeiramente eu preciso agradecer a participação de Nilson Santos na bateria e Felipe Goulart no baixo, são músicos incríveis, sem eles dificilmente esse álbum teria a mesma consistência.  Fora isso contei com a participação de Cassiano Nogara no baixo, na faixa “Guitarras Tropicais.”

2112. Gosto muito do formato trio o que me lembrou de bandas lendárias como o Cream, Emerson, Lake & Palmer, Beck, Borgert & Appice, Motörhead, Triunvirat, ZZ Top, Rush etc. Mas você já pensou em incluir um tecladista na formação?

Marcos. Sim. Tenho essa ideia faz algum tempo, de contar com um tecladista, acho que ao vivo completaria bem a sonoridade que almejo. Agora o trio é legal né, além de simplificar a logística, ensaios e tudo mais, no trio todos tem que ser intensos o tempo todo, se entregar por completo, talvez por isso que esses trios que você citou se destacaram tanto, fora o “Experience”, do Hendrix, que transcendeu tudo que já havia sido feito na época, pra mim ele é o maior de todos.

2112. Vocês ainda estão em processo de divulgação do álbum ou já estão trabalhando material novo?

Marcos. O trabalho de divulgação do álbum ainda está muito no início, embora no show entram composições novas que provavelmente entrarão no segundo álbum, ainda não pensamos em gravar de novo.

2112. Nos shows vocês incluem apenas material autoral?

Marcos. Sim, só material autoral, embora tenho pensado em incluir uma música de Jeff Beck, outro cara totalmente anormal, fora da curva.

2112. Muito interessante vocês usarem elementos da música etérea do Cocteal Twins em "De Minas A Bangkok" Que outras curiosidades o ouvinte pode esperar? 

Marcos.  Eu gosto de ouvir a música e descobrir a que imagens mentais que ela me conduz; estradas, lugares, paisagens, De Minas A Bangkok me remete a essas imagens. A primeira vez que ouvi Cocteau Twins achei incrível aqueles climas viajantes das canções, pra mim aquilo era como uma viagem da alma, como que flutuando, há sensações que são difíceis de descrever.  No entanto não é uma banda que fez parte de minha formação musical, até porque conheci a banda um pouco depois, porém as coisas que você ouve e lhe causam um impacto acabam ficando em você de alguma forma, e isso passa a influenciar o que você faz daí pra frente, mesmo que essa influência não seja perceptível para o público em geral.

2112. ... e como está a aceitação do álbum? Além do formato CD ele também já está disponível nas plataformas?

Marcos. O álbum foi lançado pela distribuidora Cd Baby, ele está nas principais plataformas digitais. Já em relação à repercussão confesso que ainda estamos um pouco carentes de shows para sentir mais a reação do público. Trabalhar com música independente no Brasil é um desafio. 

2112. O mercado da música instrumental apesar de pouco divulgado em comparação a outros segmentos possui um público fiel que sempre consome os lançamentos/relançamentos e na maioria das vezes lota os shows, não é?

Marcos. Há uns tempos atrás a música instrumental em nosso país ficava muito restrita à praia do Jazz e da música brasileira, há grandes instrumentistas nessa área, agora de uns anos pra cá começaram a surgir alguns grupos de rock fazendo música instrumental, como o grupo “Macaco Bong”, por exemplo, acho isso bacana, abre novas possibilidades, o público  de rock, blues e jazz é aberto a esse tipo de som, o problema é você conseguir chegar nos espaços para que esse público te conheça, o som instrumental é algo bem segmentado, o nicho do nicho, para chegar ao público primeiro você tem que chamar a atenção dos produtores culturais, é necessário que os produtores de show olhem um pouco pra fora da sua bolha, abrir oportunidade pra quem ainda não teve muita projeção, sem isso não surge o novo.

2112. ... sem contar os inúmeros festivais espalhados por todo o país. Isso contradiz os que dizem que não existe público para esse segmento musical, não é?

Marcos. Esses festivais acontecem em muitas cidades diferentes, me refiro aos festivais de música independente tá, não mainstream, acho que é muito legal, é importante para a criação de novas cenas musicais e tenho admiração pelas pessoas que tem a iniciativa de criar esses festivais. No entanto reitero a necessidade desses curadores olharem para o lançamento de novos artistas. Há grupos independentes que participam desses festivais que já tem décadas de carreira, e não tem problema, são artisticamente relevantes e importantes para atrair o público, porém não podemos deixar de pensar na renovação, às vezes o cara tem que se arriscar um pouco e trazer um grupo novo, ainda com pouca história.

2112. Exatamente. Mas qual é a sua visão de mercado hoje? O que melhorou e o que piorou nos últimos anos?

Marcos. Mudou totalmente com o avanço da tecnologia. Um lado bom é que a internet democratizou de certa forma, pois todos podem utilizá-la para divulgar seus trabalhos. No entanto aconteceu um fato curioso, quando começamos a curtir som, vou falar por mim, lá na década de 80, conhecíamos as bandas através do rádio, as vezes da tv e nos discos, através de amigos que às vezes te gravavam uma fitinha, ou seja você conhecia primeiro o som, a música, só depois você vinha a conhecer o artista. Hoje em dia é ao contrário... Com a massificação da internet e dos smartphones a imagem se tornou mais importante, a pessoa tem acesso a imagem do artista muitas vezes antes da música.

2112. ... uma coisa que mudou muito é como se ouve música nos dias atuais. Por onde os fãs de material físico?

Marcos. Hoje há mais formas de ouvir música e isso é bom, quanto mais se facilita o acesso a informação melhor. Já quanto aos fãs do material físico, como eu, eles sempre vão existir, hoje em menor quantidade, devido à facilidade de se ouvir música na internet, porém isso não destrói o nicho dos cds e vinis, é só você ir na Galeria do Rock em São Paulo e ver, tá todo mundo lá, porque ter as coisas que você gosta é um grande barato, eu particularmente sou fã do vinil, é o melhor som que há.

2112. Existe projetos para shows no exterior?

Marcos. Já pensei nessa possibilidade, porém estamos no início de um trabalho, ainda temos muito a fazer por aqui, no futuro quem sabe.

2112. Qual e-mail/telefone para contratar vocês e adquirir o cd?

Marcos. marcoscordeiro222@yahoo.com.br, fone : 11986314174 gostaria de passar meu canal do YouTube: @marcoscordeiro9698

2112. Obrigado pela entrevista... o microfone é seu!

Marcos. Eu que agradeço pela oportunidade. Gostaria de parabenizá-lo pelo trabalho que você tem feito divulgando a cena rock nacional e a música independente de forma geral. Vivemos uma época muito complexa no mundo, muitas divisões e conflitos, precisamos cada vez mais da música e da arte de uma forma geral, acho que a arte genuína não está na grande mídia, no mainstream, não nos dias atuais. Quem tem os meios de ação na área cultural e nas mídias independentes tem a oportunidade de agir de forma a facilitar a chegada de gente nova e talentosa, como o que você faz através do blog 2112, muito obrigado!

Obs.: Todas as fotos são do arquivo pessoal do entrevistado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário