Lee Eliseu é um veterano músico da cena que já fez parte da lendária banda Recordando Vale das Maçãs, é maestro, arranjador, compositor e atualmente é líder da Lee Recorda. Nessa entrevista ele conta um pouco da sua história e algumas curiosidades da sua carreira.
2112. Lee, você começou a estudar música muito cedo?
Lee Eliseu. Com 4 anos de idade me apresentei cantando em um programa infantil da TV Record, aos 7 comecei observar minha irmã tendo aulas de violão e piano clássico, aí comecei fuçar nos dois instrumentos e com 9 já tocava várias músicas do RC no piano e violão assimilo os dois instrumentos.
2112. Soube que você mudou após assistir o mago Rick Wakeman na televisão. O que mais te impressionou?
Lee Eliseu. Um amigo de escola me dava carona diariamente tocando uma fita K7 de Viagem ao centro da terra, pedi uma cópia e passei ouvir direto, eu sempre imaginava sintetizadores com orquestra e ele realizou exatamente assim.
2112. Sou fascinado pelo álbum The Six Wives Of Henry VIII. Entre os álbuns gravados por ele qual é o seu predileto?
Lee Eliseu. UUuuuiiii! Acho que todos! cada qual com seus detalhes marcantes.
2112. Tirando o Rick... que outros músicos e bandas te influenciou?
Lee Eliseu. Nossa .... de Beatles à Novos Baianos, de Jobim à Zé Rodrix, Gil, Caetano, Chico, Ivan... até seresteiros das antigas.
2112. Você é o tipo de pessoa/músico que ouve de tudo um pouco?
Lee Eliseu. Como músico da noite e de navios de cruzeiros por 10 anos, em várias bandas, piano bar e tal... tinha que ouvir de tudo, mas gosto disso.
2112. Que bandas tem chamado a sua atenção nos últimos anos?
Lee Eliseu. Vixi ando bem desatualizado do que está rolando, coisa de músico velho rsrs.
2112. Como professor de música que conselhos você daria para quem pretende se ingressar no mundo da música ou mesmo já está batalhando a procura do seu próprio espaço?
Lee Eliseu. Estudar, ouvir, detalhar, observar, se renovar, ser atento, dedicação, paixão.
2112. Na sua época para gravar um compacto ou um álbum antes era necessário subir muitos e muitos degraus. O que você acha de uma banda que hoje mal se formou e já está gravando?
Lee Eliseu. Uma faca de 2 gumes... ajuda muito toda essa tecnologia, mas talento e valores musicais perderam a moral. Ficou pra segundo plano. Falando em termos de mercado!
2112. Acredito que antes de gravar, uma banda deveria primeiro amadurecer sua proposta musical para que não haja arrependimentos futuros, não é?
Lee Eliseu. Sim, mas mesmo assim muitas idéias pintavam durante a gravação que acabavam ficando pra depois por conta do tempo de estúdio. Uma pena! A música Água pintou assim... tomei até pito do produtor kkk.
2112. A partir de 1974 você se torna músico profissional. Mas antes disso você chegou a participar de alguma banda?
Lee Eliseu. Só festivais estudantis, universitários, esse época a bossa e samba estavam em alta. Toquei até bumbo em um programa chamado Ferreira Neto entrevista kkk. Ganhei vários desses festivais. Foi um bom começo. Conheci muitos músicos bons da época.
2112. Como você ingressou no Recordando Vale das Maçãs?
Lee Eliseu. Viajei com um grupo de teatro de trem para uma apresentação no interior e havia um piano no local que fiz a festa... ai um dos músicos (Pavitra) me convidou para conhecer uns músicos diferentes que tinha violino e flauta. Foi assim... vi aquele bando de bicho grilo e pensei achei meu povo, minha tribo rsrs. Tipo amor à primeira vista, e já foi marcado um ensaio aí começou tudo. A música que me levou pra banda foi a Rancho, filhos e mulher. Está no lado b do LP As Crianças.
2112. Em 1977 é lançado o antológico “As Crianças da Nova Floresta”. Como foi realizado a composição do álbum como um todo. Vocês faziam muitos experimentos?
Lee Eliseu. A gravadora GTA era da TV Tupi. Me deram um toque logo que inaugurou... Foi ai que levei uma fita do RVM e depois de alguns dias me confirmaram a gravação. Infelizmente a TV Tupi faliu e fizemos poucas apresentações de divulgações ao vivo. Uns 2 ou 3 shows apenas. Além disso foram prensados LPs com músicas de um outro disco tipo gospel brega. Foram recolhidos mas isso prejudicou um tanto.
2112. Você parece que não ficou satisfeito com o resultado final das gravações. O que mais te incomoda ao ouvir o álbum hoje?
Lee Eliseu. Gravamos em um estúdio de 8 canais sendo uma banda de 7 integrantes. Na prensagem também houve uma perda enorme de qualidade. Todos nós ficamos insatisfeitos quando ouvimos... Ficou sem peso, tudo muito agudo... Não foi só eu, foi unânime a insatisfação.
2112. O álbum foi lançado em plena efervescência do punk rock com suas músicas curtas, sujas e letras nada filosóficas num oposto a tudo o que pregava o rock progressivo. Como foi a aceitação do álbum na época?
Lee Eliseu. Vi jovens rindo uma vez que tocamos em uma loja de discos na Paulista. Foi muito triste pra mim. Nosso som era e é diferenciado. Quase não existia público pra esse tipo de som, mas quem assistiu aos shows aplaudiam com muito entusiasmo e emoção.
2112. Muitos fãs e críticos afirmam que o RVM nunca recebeu o devido reconhecimento. Qual a sua opinião a respeito dessa afirmação?
Lee Eliseu. Concordo. Acho que não viam $$$ lucros nesse tipo de banda.
2112. Você sabe dizer se existe demos ou sobras de estúdio das gravações de As Crianças da Nova Floresta?
Lee Eliseu. Acho que não! O que pode ter são fitas de ensaios e algum show, mas eu mesmo não tenho.
2112. Sorriso de Verão se tornou o grande hit da banda sendo bastante executada ainda nos dias de hoje. Isso de uma certa maneira surpreendeu vocês?
Lee Eliseu. Quando regressei pro RVM em 79 ou 80 fomos falar com Arnaldo Sacomani e ele pediu uma música romântica, comercial, bonita e no padrão RVM. Pensei no ato, vou fazer essa música. Depois de feita mostrei ao Fernando Pacheco que disse rapidinho... vamos gravar. Nesse ínterim perdemos o contado do Arnaldo Sacomani e fizemos uma produção independente (novidade na época) A fita foi levada para uma rádio de Santos e começou tocar sem parar por pedidos constantes, ficando em primeiro lugar nas paradas de todas as rádios de Santos e baixada santista por muito tempo. Acho que isso meio que dividiu o RVM em progressivo e comercial. Muitos conhecem só um lado do RVM.
2112. A partir de 1987 o álbum passa a ser distribuído na Europa e no Japão o que gerou uma apresentação na França. Como foram esses shows? Existe material gravado dessas apresentações?
Lee Eliseu. Eu já estava fora essa época, não tive participação na viagem mas fiz vários shows em 87 em Minas SP, Santos, com Pacheco, Miltão e um outro tecladista convidado... Tenho um show no Centro Cultural de SP mas o dificil é saber onde está o dvd.
2112. A banda tinha projetos para gravar um segundo álbum? O que de fato aconteceu que o projeto foi abortado?
Lee Eliseu. Na real o segundo álbum meio que existe, é o Himalaia. Pacheco gravou um lado solo e o lado b músicas com o RVM que havíamos gravado em Curitiba no mesmo estúdio de Sorriso de Verão depois de um show no Guairão.
2112. O que levou você a sair da banda?
Lee Eliseu. Casamento kkk. Todos nós casávamos e saiamos, separava voltava pra banda kkk. Sai definitivamente por motivos delicados... $$$ e também não me agradava ter só instrumental no RVM.
2112. Você acha possível um dia a formação que gravou o álbum se reunir novamente para alguns shows ou mesmo gravar novo álbum?
Lee Eliseu. Não! Miltão faleceu em 2012. O incrível autor de A luz da Natureza seguido de As crianças da Nova Floresta, Ferreiro do Céu, O Ciclo da Vida e outras joias de alto quilate.
2112. O que você fez no hiato entre a sua saída do RVM e a formação da Lee Recorda?
Lee Eliseu. Pianista e tecladista de navios de cruzeiros Brasil-Europa, bandas cover, produções em meu estúdio em SV, aulas de música domiciliar e escolas. Lee Recorda começou com um vídeo de Ferreiro do Céu que faz em homenagem ao RVM e ao Miltão.
2112. A Lee Recorda tem como meta “... resgatar as músicas cantadas que permaneceram inéditas ou foram gravadas em condições precárias devido às limitações da época.” Ficou muito material sem gravar?
Lee Eliseu. O RVM era uma fábrica de música... as idéias fluíam e todos compartilhavam e criavam, coisa que já não rola mais pela distância de residências e um pouco de conflito de idéias e pontos de vista.
2112. A banda já lançou dois excelentes trabalhos que trouxe de volta a magia dos bons tempos do rock progressivo. Já existe projeto para um terceiro álbum?
Lee Eliseu. Com muito muito trabalho e até sacrifício conseguimos chegar até aqui. Apesar de muito pouco retorno graças aos amigos, integrantes da banda e a maravilhosa professora Maria Eliza Mattozinho da EACH-USP temos material e condições de um novo álbum sim... vai depender de um final seguro da pandemia.
2112. Nos dois álbuns gravados pela Lee Recorda você apenas aproveitou o material não gravado pelo RVM ou incluiu também material recentemente?
Lee Eliseu. Recente também.... Utópico, Concierto Grosso em Lee menor que fiz para o RVM mas nunca rolou, Class Prog e outra que não lembro agora.
2112. Ao contrário de As Crianças da Nova Floresta vocês tiveram tempo suficiente em estúdio para que tudo saísse como você queria?
Lee Eliseu. Sim de sobra! Eu que vacilei em não aproveitar mais o tempo tido. Poderia ser melhor... Já tinha um show marcado e infelizmente tive que recusar participações importantes como integrantes da banda O Terço que admiro muito entre outros. Isso no primeiro. No segundo podia ter melhorado minha produção...
2112. Quero te dar uma sugestão para um dos próximos lançamentos da banda. Que tal um álbum ao vivo? Poucos são os registros de nossas bandas nos palcos. Você já pensou nessa possibilidade?
Lee Eliseu. Teria que ter mais músicos de apoio, são muitos teclados, vozes, guitarras, violão e tal. Em estúdio facilita dobrar esses instrumentos e prefiro músicos presenciais pois não gosto de tocar com pista gravada.
2112. O progressivo na minha opinião perdeu muito de suas características quando abriu mão das grandes suítes em favor de músicas com tempos menores. Sei que essas decisões foram tomadas como medidas de sobrevivência mas essa atitude levou muitas bandas a um verdadeiro cataclisma musical. Qual a sua opinião a respeito desse assunto?
Lee Eliseu. Nossa, o prog foi prejudicado justamente pelo longo tempo de música... isso comercialmente pra rádio e TV não funciona. O que funciona são os enlatados que estão cada vez piores.
2112. Você curtiu as bandas do movimento neo-prog?
Lee Eliseu. Não conheci, como disse ando desatualizado.
2112. Bandas como o Marillion, IQ, Pendagron, Pallas, Twelfth Night, Arena etc trouxe de volta o rock progressivo de volta aos palcos não é?
Lee Eliseu. Sei que existem muitas bandas trazendo o prog de volta, sei que são muito boas mas não tenho visto quase nada de música. Coisa de musico muuiiito velho kkk.
2112. A única restrição que faço contra o movimento é em relação a algumas bandas que usam elementos da música pop para uma melhor aceitação de sua música. Sou meio vintage em relação a isso... e você?
Lee Eliseu. Como dizia o velho guerreiro "nada se cria, tudo se copia".
Lee Eliseu. Inspiração? Sou movido a estímulos, se me pedem um jingle faço e gravo em alguns minutos, quando solteiro fazia música quando estava apaixonado ou interessado na gata, assim como Guarabira me disse uma vez. Atualmente não tenho me inspirado há muito tempo por falta de estímulo mesmo.
2112. Qual telefone/e-mail para a contratação de shows ou para a aquisição de material de merchandising?
Lee Eliseu. 11 989458835 email - leerecorda@gmail.com
2112. ... o microfone é seu!
Lee Eliseu. Agradeço a oportunidade de contar um pouco minha história e a história do RVM. Muito obrigado e disponho-me a qualquer nova informação. Abraços.
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