quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Entrevista Vzyadoq Moe



O grupo surgiu em 1986 em Sorocaba, interior de São Paulo e lançou apenas dois álbuns: O Ápice e Hard Macumba e acabou. Mas a banda com o passar dos anos está mais viva do que nunca e o álbum O Ápice cada vez mais cultuado. 

2112. O Ápice este ano completa trinta e um anos e cada vez mais vem despertando o interesse de uma nova geração que praticamente esgotou o seu relançamento em cd. Como vocês explicam isso? 
Tudo foi feito espontaneamente, sem pensar muito, mas desde o início o VZ buscava romper paradigmas e fazer músicas legais sem repetir fórmulas usuais. As letras poéticas e oníricas já cantavam a transformação que buscávamos. Não tínhamos muito dinheiro e os improvisos, principalmente na bateria e percussão de lata, gerou junto com a barulheira das guitarras e a pulsação e efeitos do baixo uma sonoridade que não ficou datada na linha de tempo. Os meios digitais contribuíram para ampliação do conhecimento da nossa música. Basicamente O Ápice tem músicas boas com a marca registrada VZ, num diálogo punk-rock com Brasil. 

2112. O álbum apesar de ser genial amargou no ostracismo por vários anos. Isso faz lembrar bandas seminais como Os Mutantes, Harry, Fellini, Peso, DeFalla etc que só tiveram o devido reconhecimento com o passar do tempo. Isso magoa vocês?

Tem diferenças grandes, os Mutantes por exemplo gravaram com as estrelas da MPB e cantavam em festivais na TV; o DeFalla tocava na 89 FM na época. O Vzyadoq Moe não, a gente era das garagens e porões mesmo. Mas, era exatamente isso que procurávamos. Então, não tem mágoa nenhuma. Demos muitos shows de 1988 até 1993, interior de São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Londrina, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, entre muitos. Fomos até convidados para tocar no New Music Seminar em Nova Iorque, EUA; que não pudemos ir por falta de grana mesmo. Gravamos pela Wop Bop, um selo que todos os discos publicados são seminais e importantes. Gravamos em coletâneas brasileiras e gringas super legais como: Enquanto Isso... Sanguinho Novo, No Wave, Colt 45. O Ápice foi relançado em CD e agora está nas plataformas streamings. A gente não tem mágoa não, nos divertimos forte.

2112. A crítica quando não entende o som de uma banda ela rotula e me lembro que vocês ganharam vários deles: pós-punk, gótico, samba, kraustrock, experimental, industrial... Como vocês definem o som do Vzyadoq Moe?

Olha, a coisa mais legal é que a crítica gostava do VZ, Sonia Maia, Bia Abramo, Celso Pucci (o querido Minhoca) escreveram textos muito legais e delicados. Outros eram um show de desencontros, falavam entre uma coisa dark e gótica, industrial e experimental. Pensamos que o texto do Mario César de Carvalho para a Folha de SP foi o que chegou mais perto. O som do Vzyadoq Moe é dadaísta por princípio e existencialista por formulação artística, ele é a junção de 5 caras que queriam fazer algo novo, é o VZ nada mais. 

2112. Como surgiu a parceria entre vocês e o selo Wop Bop?

A história do Vzyadoq Moe não seria a mesma sem a presença do Will Baptista, também de Sorocaba, que pegou as fitinhas cassete demo da banda e saiu por São Paulo apresentando para um monte de gente legal. Nessa ele cruzou com o Antonio e o René da Wop Bop, daí o resto é história. O Will foi quem nos levou para São Paulo, onde tocamos realmente bastante, muito mais que Sorocaba onde demos uns 3 shows. Ele também nos apresentou na Bizz, que deu muita matéria legal com a gente. A Wop Bop foi super legal conosco, acertando as coisas todas de direitos e grana direitinho, ajudou a tentar promover, mas a gente era muito estranho.

2112. Quais lembranças vocês tem das gravações do álbum? A gravação foi realizada numa única sessão?

O Ápice foi gravado nos antigos Estúdios Eldorado no centro de São Paulo. Um estúdio já antigo para época, todo analógico gravando em fitas de 1 polegada. O produtor foi o José Augusto Lemos, que emprestou seus samples e a veia digital para a bolacha. Tinha um gente boa que aparece na foto da capa do encarte, mas que esquecemos o nome. A Marcinha Montserrat apoio e participou também. Foi bem legal, gravamos as baterias e baixos em primeiro, depois as guitarras, por último os vocais. No dia da gravação dos vocais ninguém da banda pode ficar, deram um conhaque e deixaram o Fausto Marthe à vontade para cantar suas poesias. Não tínhamos instrumentos profissionais então o José Augusto emprestou uma guitarra e o Angelo Pastorello, que era baixista do Violeta de Outono, emprestou o baixo dele, de quebra virou o fotógrafo oficial do álbum. Assim, colaborativamente fomos gravando. Foi complicado para achar a sonoridade, mas finalmente saiu o LP e fomos para os shows.

2112. Me digam uma coisa: Como foi gravar com aquela bateria construída a partir de sucatas e objetos não convencionais? Tento imaginar a cara do produtor e do técnico de estúdio diante de uma situação inusitada como essa ou você usaram uma batera convencional?

Realmente a bateria de sucata da primeira fase da banda era bem complicada no quesito acertar o som. Tanto em shows como no estúdio umas latas brilham mais que as outras, os microfones estavam preparados para som das peles. No fim, tratavam como se fosse o som de pratos, mas não era, soava mais seco. Mas o resultado final é sempre instigante, especialmente nas músicas Desejo em Chamas e Não Há Morte, onde a lata se sobressai e confere um tempero único para as canções.
2112. Lembro que havia uma grande expectativa em torno da banda e do próprio álbum. O que deu errado? Porque O Ápice não vingou?

Como O Ápice não vingou? Você está nos entrevistando exatamente por causa dele. Precisamos desmontar essa cultura da personalidade, não queríamos fama, queríamos romper horizontes, então entendemos que deu tudo certo. Estamos tocando direto nos playlists por aí...

2112. Como o público reagia nos shows visto que o som de vocês era bem mais ousado, pesado e experimental que bandas como RPM, Legião Urbana, Ultraje a Rigor, Zero etc?

Nos shows o VZ realmente se completava. Sempre tocamos cenografados, com roupinha especialmente desenhada para os shows, o Morto (Fausto Marthe) cantava com os figurinos mais radicais, e a gente ensaiava bastante e tocava direitinho. Tinha uma trupe que acompanhava, viajava junto, ajudava na montagem, cenografia, tudo. E tinha público em todos shows. Agora no começo a metade do público vaiava legal. Tinha gente na plateia que gritava: - Chega! Ai que a gente encompridava ainda mais o show. Nosso circuito era alternativo: Espaço Retrô, Cais, Der Temple, Mambembe, e outras biqueiras. Mas, em todos eles voltamos para tocar inúmeras vezes. Tocamos também no Sesc Pompeia, Projeto SP, Centro Cultural SP, entre outros lugares bacanas também. O show foi ficando cada vez mais pesado e já era bem hardcore na última formação como quarteto na época da música do clip Rompantes de Fúria. Mas, o som da época era bem mais pesado, agora parece que a maioria está mais para Belle e Sebastian.

2112. Na opinião de vocês o atual cenário está melhor ou pior do que quando vocês surgiram? 

O cenário independente sempre se renova e apresenta novas possibilidades. A gente foi muito feliz com a banda, mas achar que era melhor antes não confere. O que entendemos em nosso momento no final dos 80 e início dos 90, principalmente nos 80 a busca era por diferenciação, hoje está mais para aceitação.

2112. Outro diferencial no som da Vzyadoq Moe era as letras de Fausto Marthe com influências do dadaísmo e do impressionismo Alemão...

As letras representam muito para o VZ, pois delas saiam a construção sonora. Sempre uma microfonia vinha com os versos do Fausto: As trincas nas paredes; os desencantos puxando o tapete da rotina e da mesmice para trazer o incauto ouvinte para o abismo. Vzyadoq Moe não existe sem as letras que conduzem os climas e as texturas musicais.

2112. Orlak disse certa vez numa entrevista que: "Mercenárias estão acima dos outros, mas o Vzyadoq Moe está acima de tudo." Esse pensamento ainda persiste? 

As Mercenárias foram a razão de existir da banda, cujo impacto do show delas em Sorocaba provocou um cataclismo que virou o VZ. Nosso primeiro show em São Paulo foi abrindo para elas, depois tocamos várias vezes juntos. Até ensaiamos junto algumas vezes em Sorocaba e São Paulo. Os 3 Hombres também vinham direto ensaiar com a gente em Sorocaba. Era uma comunidade roqueira dos independentes. A gente falava isso porque buscávamos o ápice das coisas.

2112. Outra afirmação interessante: "Tem muita gente que acha que banda nacional não presta." Luto com meu blog para tentar mudar essa visão equivocada. Qual a visão de vocês hoje acerca da atual cena?

Sempre vão haver bandas novas e boas. A história do rock e punk brasileiros é linda, temos bandas de expressão mundial com a chancela do Brasil. É uma afirmação pra lá de colonizada essa. Eu vejo é muita banda gringa ruim mesmo, mas que não param de tocar nos playlists por ai empurrados pela indústria musical.

2112. A primeira vez que ouvi falar da banda foi na extinta Revista Bizz que trouxe um breve histórico e uma resenha do álbum O Ápice e depois não soube de mais nada. Anos mais tarde descobri a existência do álbum Rádio Macumba e também do fim da banda. O que aconteceu nesse meio tempo e o que mais motivou o retorno da banda?

O Vzyadoq Moe teve 3 formações. A primeira, com Peroba batera, Degas baixo, Fausto vocal, Marcelo e Jaksan guitarras. Depois saiu o Jaksan e entrou o Fernandão nas guitarras. Já no início dos anos 90 o VZ virou um quarteto com Peroba, Degas, Fausto e Marcelo. Nessa formação gravamos o único clipe que fizemos para a MTV, o Rompantes de Fúria. Posteriormente no meio dos anos 90 juntamos material gravado e não compilado e soltamos o Hard Macumba, que está disponível no Spotify. Ainda temos outros fonogramas, poucos, que ainda não soltamos. Em 2010, o VZ voltou para um show no Asteroid em convite irrecusável de amigos da banda The Name, tem algumas músicas disponíveis no youtube e soundcloud. Tem também no soundcloud algumas fitas cassete com ensaios gravados. E tem tudo na nossa página (http://vzyadoqmoe.com.br/ ).
2112. Vejo que muitas bandas perderam o senso de ousar, de experimentar por estarem presas aos vícios mercadológicos. Isso fode tudo, não é?

Sim, querer agradar, ao invés de agredir, nem rock e nem punk é, daí fode mesmo.
2112. Falem um pouco sobre a criação e gravação do álbum Hard Macumba. Musicalmente o que torna diferente de O Ápice?

O que diferencia O Ápice para nós são as músicas, gostamos de todas, elas não se repetem em nenhum aspecto, ao contrário vão provocando um turbilhão emocional. O Hard Macumba a invenção se sofistica ainda mais porque tecnicamente dominávamos mais e tínhamos melhores instrumentos para tocar. A coisa do Brasil é pronunciada, as letras crescem em formulações e imagens ainda mais fortes e oníricas. Também, somos mais agressivos na execução e formulação das músicas. Já na fase final como quarteto, enxugamos o som e ficamos mais diretos.
2112. A repercussão desse álbum foi melhor que O Ápice?

No Spotify tirando Redenção que é a mais pedida, as demais músicas mais tocadas são do Hard Macumba. Esse álbum define e consolida o VZ como banda e proposta musical particular.

2112. Vocês participaram do disco tributo Sanguinho Novo em homenagem ao mutante Arnaldo Baptista. Como surgiu o convite?

Bom a gente frequentava a panela roqueira da época, tinha um apelo diferenciado, daí o Alex Antunes e o saudoso Miranda convidaram a gente. Topamos mas ninguém nunca tinha ouvido o Arnaldo, corremos atrás do prejuízo e decompusemos totalmente Bomba H Sobre SP. Mas, não tínhamos muito haver com a proposta dele.

2112. Vocês descontruíram toda a música dando a ela uma nova visão. Ficou foda!

Sim, como não colava com a gente a sonoridade setentona do Arnaldo, partimos para re-criar e fazer da emoção dele, a nossa emoção. A participação no Sanguinho Novo sem dúvida ajudou muito o conhecimento do VZ.

2112. Outra participação interesante foi em Enquanto Isso...? produzida por RH Jackson e Alex Antunes com várias bandas indies brazucas. Foi nesta coletânea que vocês incluíram Santa Brigda e The Cabinet cantada em inglês. Vocês pretendiam invadir o mercado externo?

A gente tinha proposta de tocar na gringa e pensou em fazer umas letras em inglês, mas não foi muito nossa praia. Paramos ai mesmo. Mas, aproveitamos um espaço totalmente livre e autoral para experimentar e apresentar novos caminhos. 

2112. Assistindo aos clipes da banda eles tem uma edição rápida que lembra muito as produções do punk e do grunge... tudo muito urgente. Isso é intencional ou é o jeito da banda trabalhar?
Temos um clipe em toda nossa vida que é o Rompantes de Fúria. Na época do VZ como quarteto a gente estava no auge do barulho e da urgência. Sim, foi intencional e a direção do Gil Caserta e do Sérgio Martinelli foi mestre em captar nossa essência. Gravamos no Anhangabaú no centro de São Paulo num prédio centenário na esquina da São João com Prestes Maia.

2112. Existe projeto de lançar disco novo nos próximos meses? Como anda o processo de composição?

Não, talvez alguns fonogramas ainda não lançados como Via Plastex e Rompantes de Fúria da fase quarteto que ainda não estão online.

2112. Os álbuns O Ápice e Hard Macumba terão novas reedições em cd/vinil ou serão disponibilizados nas plataformas digitais? Quem sabe?!

2112. Qual o telefone/e-mail de contato para shows?

Visitem nossa página www.vyzadoqmoe.com.br que lá você nos conecta. Aliás lá tem muito material para ser encontrado. Também, em nossa Fanpage no Facebook/VzyadoqMoe

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