quinta-feira, 18 de abril de 2019

Entrevista Banda Power Blues



O blues pode ser comparado a um grande útero musical em constante trabalho de parto gerando filhos bacanas como a Power Blues. A banda que está na luta a vários anos abriu um espaço na agenda e nos concedeu esta entrevista para contar um pouco da sua história. Leiam e divulguem!!    

2112. A Power Blues desde que surgiu vem forjando a ferro e fogo o seu nome na cena do rock brazuca. Como é manter uma banda hoje na ativa? Quais as maiores dificuldades enfrentadas por vocês?

Daniel Gerber: Primeiramente gostaríamos de agradecer ao Blog Fúria 2112 pela oportunidade e pelo incrível trabalho de acompanhar, pesquisar e levar ao público este precioso trabalho de registro da cena do rock brasileiro. Para manter uma banda de rock no Brasil hoje em dia é necessária muita força de vontade, persistência e amor à música. É necessário ser verdadeiro, senão os obstáculos são tantos que muitos desistem. As condições do Brasil de modo geral e do “mercado” são contrários ao que uma banda necessita. Falta de condições, cachês, custo altíssimo de logística para viajar e contar com o devido equipamento são verdadeiros desafios. Em adição a isto, voltamos décadas no tempo - em termos de mídia - para uma época em que o rock ficou relevado a um segundo ou terceiro plano. Somos novamente um gênero alternativo e de contracultura. Em compensação o público de rock, ao contrário do que pode dar impressão é enorme.

Daniel Kid Ribeiro: Manter uma banda é como manter um casamento, só que a hora do verdadeiro prazer é a hora do show. Então a nossa eterna busca é em tocar sempre, e manter uma agenda repleta é o nosso maior desafio no momento.

Paula Mota: Hoje em dia uma banda de rock tem que batalhar muito, como não tem ajuda de mídia e os cachês quando tem são baixos seria legal que o público de rock fosse em peso aos shows, sejam em bares, teatros ou onde for.

2112. A crise levou muitos locais a fecharem suas portas e os que insistem estão tendo que suar a camisa. Com isso falta estrutura, cachês decentes, público, patrocínios... O que na opinião de vocês poderia ser feito a pequeno, médio ou longo prazo para reverter toda essa situação?

Daniel Kid R. Hoje o maior desafio é atrair o público pra fora das suas casas, Smart Tvs e Smartfones...então tentamos ao máximo ter atrativos para que seja interessante e compensatória a ida aos shows. Os governantes podem sempre ajudar ao bancar e estruturar eventos culturais ao céu aberto, estimulando as produções nacionais.

Daniel Gerber. Primeiramente que as pessoas que curtem rock comecem a ir mais aos shows ao vivo. Eu acredito que realmente não seja fácil para a maioria dos empreendedores como donos de bares e casas de espetáculos, bem como muitas empresas que normalmente estenderiam patrocínio também tem que operar com cortes de custos significativos. Solução? Bem, além de o país reverter a crise econômica de modo geral, incentivos por parte de governo para usar parte dos impostos que empresas, principalmente as pequenas e médias possam aplicar em cultura ou divulgação. Isto ajudaria muito, pois faria possível a melhor divulgação e a possibilidade de aplicar parte dos impostos em melhores cachês e equipamentos à disposição das bandas. Ou seja, criar sistemas tipo Lei Rouanet ou Proac SIMPLES, para todos e para valores menores, sem essa elitização de incentivos. Uma tecla que sempre martelo nas entrevistas é a questão de valorizar mais o produto interno e parar com infantilidades do tipo "bandas brasileiras X bandas gringas". Isso de uma certa maneira atrasa o processo de profissionalização das bandas, não é?

2112. Uma tecla que sempre martelo nas entrevistas é a questão de valorizar mais o produto interno e para com infantilidades do tipo “bandas brasileiras x bandas gringas”. Isso de uma certa maneira atraza o processo de profissionalização das bandas, não é?

Daniel Gerber. Bom, vejamos, eu pessoalmente vejo como estímulo para crescer e para que o nível geral, principalmente em termos de apresentação (show) melhore. Mas é verdade que muitas pessoas simplesmente não acreditam que bandas nacionais (ou locais) possam ter o mesmo nível, muitas vezes sem sequer ir aos shows ou escutar a música produzida aqui. É incrível mas acontece. O Brasil não deve nada em termos de competência individual de artistas. Muito pelo contrário, exportamos excelentes músicos e obras por falta de condições de sobrevivência no país. Uma frase já bem popular no meio diz: “O camarada paga R$800,00 para ver uma banda gringa mas não paga R$30,00 para ver a banda local tocar”. Infelizmente é verdade. Existe sim uma espécie de sentimento de inferioridade em relação a que “tudo que é estrangeiro é melhor”, e não é só no campo da música. Uma grande bobagem... Mas tendo dito isto, também é verdade que os espetáculos (shows) das bandas estrangeiras utilizam tecnologia de ponta em termos de som, luz e vídeo, só que quando eles se apresentam no Brasil todo este equipamento é locado de empresas locais. Ou seja, está tudo aqui, só não ao alcance das nossas bandas.

Daniel Kid R. Na verdade este comparativo é natural, ao ponto que escutamos muito mais rock de fora do país, onde a cultura é muito mais prolífera. E isso nos torna responsáveis em trazer ao público um espetáculo com excelência internacional, elevando a exigência por um show com som, luz e performances irretocáveis. O público está cada vez mais exigente.

2112. A Power Blues segundo seus fãs tem hoje uma das mais eletrizantes e dinâmicas performances do rock nacional. Isso de uma certa maneira gera muitas responsabilidades e expectativas, não é?

Daniel Gerber. Que nada, gostamos mesmo é de tocar. Quando estamos no palco damos tudo de melhor, de forma honesta e principalmente, a gente curte mesmo o som, então vira só tesão e rock. Não tem nada melhor que o palco e a interação com o público. É muito mágico. Parece que a vida entra em pausa entre um show e o outro.

Daniel Kid R. Sim, mas não enxergamos tudo isso! Agradecemos os elogios e com certeza iremos nos empenhar pra que o show sempre melhore.

2112. Mas me diga uma coisa: o que uma pessoa que nunca assistiu a um show de vocês pode esperar?

Paula Mota: Rock, bons sons, diversão e um ótimo astral.

Daniel Gerber. Música, tocada com paixão, honesta e sem barreiras. Tocamos de dentro e o que sentimos. É contagiante.

Daniel Kid R. Blues e rock da melhor qualidade, tocado com empenho, competência e profissionalismo.

2112. Vocês têm uma extensa folha de bons serviços prestados ao rock paulista com passagens por diversas bandas. Qual é a história de vocês?

Paula Mota: Comecei a cantar quando era criança e meu pai tinha uma banda de baile nos anos 80, ele me deixava cantar nos ensaios e eu fui pegando gosto pela música, ele era muito exigente então foi um bom começo... uma ótima escola. Aos 15 comecei a cantar numa bandinha do colégio, era meio que uma brincadeira mas aprendi bastante nesta época, viajávamos pelo interior para fazer shows, era muito divertido. Depois disso passei a me dedicar a estudar e trabalhar e voltei a cantar aos 23 anos na banda do Paulo Sá chamada Lado C, fiquei por pouco tempo porque estava começando minha carreira profissional e não tinha muito tempo na época para me dedicar a música. Mas foi inevitável voltar quando conheci o pessoal do Made em 2008 e me chamaram para um teste pra ajudar nos backings do disco Rock de Verdade, gravei com eles e fiquei até 2013 quando sai e acabei começando minha própria banda, chamada Deu pau lá no Blues que se transformou em Power Blues com a entrada do Daniel em 2014, ele trouxe o autoral e deu um novo sentido a banda, amei as músicas dele e entrei de cabeça, aí foi mudando totalmente a formação até chegar no que é hoje.

Daniel Gerber. Bom, eu, comecei aprendendo vários instrumentos aos 11 anos e aos 12 ganhei a 1ª guitarra, isto foi em 1073/74. Fui passando por bandas nos anos 70 na adolescência, e no início da década de 80 participei do Santa Gang, da banda Metrópole (1ª Gravação em disco) e finalmente do Made in Brazil banda que participei como guitarrista e parceiro musical em 2 discos: Deus Salva o Rock Alivia (1985-86) e Made in Blues (1990). Depois já morando nos USA fiz parceria com o Oswaldo Vecchione em mais 5 músicas gravadas pelo Made no disco Sexo, Blues e Rock and Roll (1995). Nos Estados Unidos participei de algumas bandas como The Mongrels e Charlie Doc Band. De volta ao Brasil Power Blues na cabeça.

Daniel Kid R. Bem, eu já estou nesse rock a 21 anos. Trabalhei anos como roadie da Patrulha do Espaço, tive alguns trabalhos autorais de diversos estilos como o Natural Reggae, Impacto Mosh e Sons de Saturno, trabalhei com diversos artistas como sideman com o quarteto vocal A Quatro Vozes, Ozi, Chico Suman, Casa das Máquinas, Prospero Albanese e Toni Tornado. No momento também trabalho com Walter Franco e seu filho Diogo Franco, com o Ronaldo e Os Impedidos,Marquês,Rockover e Satisfactor.

Daniel Gerber (por Franklin Paolillo). O nosso baterista Franklin Paolillo tem uma “folha de serviços” vastíssima que inclui Rita Lee e Tutti Frutti, Made in Brazil, O Terço, Joelho de Porco, Raul Seixas, Marcelo Nova e mais uma quantidade de banda e artistas ao longo de 50 anos de carreira. Logo após terminarmos as gravações e mixagem do 1º álbum da Power Blues, ele sofreu um acidente vascular e está em recuperação. Por sorte vemos progressos semana a semana, mas é necessária muita paciência. Enquanto isto o (excelente) baterista Roby Pontes (Golpe de Estado) está substituindo nos shows da banda.

2112. Ano passado vocês lançaram o tão esperado primeiro álbum da banda. Havia muita cobrança por parte dos fãs?

Daniel Gerber. E nós mesmos não víamos a hora de gravar. Acabamos levando mais tempo para caprichar na gravação. Além da performance em si (execução) gastamos tempo e atenção nos timbres, diferentes tipos de microfones no processo de captação, na”separação” de instrumentos, a timbragem geral, já que tudo isto define o som da banda, até o processo de masterização levou seu tempo. Mas chegamos ao ponto que queríamos. Então acabamos no final de Dezembro de 2018. Vamos lançar neste primeiro semestre de 2019.

2112. Diante dos "free dowloads" está compensando investir na gravação de um cd? Pergunto isso levando em conta os altos custos que envolvem todo o processo de uma gravação como estúdio, arte gráfica, prensagem, produtor, técnicos... Como reagir diante dessa situação?

Daniel Gerber. Financeiramente não. Não compensa. Mas musicalmente sem dúvidas. Pois ao invés de 1 ou 2 músicas estamos gravando uma obra inteira, que tem sequência, é muito mais rica e com substância.

Daniel Kid R. Infelizmente não. Mas sem um disco lançado fisicamente pro mercado uma banda não existe né... então chegou a hora de nascer.

2112. Vocês poderiam falar um pouco sobre as gravações e quanto tempo tiveram em estúdio?

Daniel Gerber. Bom, no total foram mais de 70 horas. Isto sem contar masterização e pré-mixagens. Poderíamos ter usado bem mais, mas tivemos a sorte de escolher um estúdio fantástico, o Orra Meu, e isto ajudou muito a economizar tempo de timbragem, mixagens e mesmo em gravação. Gravamos com a dupla. André Miskalo e Gustavo Barcelos, que são excelentes profissionais, também são músicos e conhecem muito bem o equipamento. Inclusive ajudaram muito no passo a passo da produção em si. A Paula gravou todos os vocais, back vocals e percussão, o Daniel Kid tudo em contrabaixo e alguns back vocals também. O Franklin (Paolillo) gravou todas as baterias e percussão. Eu gravei as guitarras e dei uma palhinha em um back vocal. Cada um escreveu seus próprios arranjos em termos de instrumentos.

2112. Entre as faixas gravadas quais vocês destacariam?

Daniel Kid R. Não dá pra destacar uma faixa ou um momento do disco, ele foi criado paqra, apesar de ser repleto, soar como uma coisa só.

Daniel Gerber. Esta pergunta é difícil de responder. Como não são todas do mesmo estilo, eu prefiro elas de acordo a como estou me sentindo no momento. São como filhotes. Gosto de todas.

2112. O álbum traz nove temas autorais o que os diferencia dos demais álbuns do gênero que sempre inclui releituras de grandes clássicos. O que levou vocês a fazerem o caminho inverso e como é o processo de composição da banda?

Daniel Gerber. Somos uma banda autoral por essência. A música emana, é impossível represá-la. O nosso foco, acima do virtuosismo individual é nas composições e na sonoridade de forma geral. Nós seguimos uma linhagem de rock autoral paulista e brasileiro que não pode parar no tempo nem de evoluir. Na verdade eu até queria gravar alguma releitura, mas temos tantas músicas para apresentar que acaba ficando para trás. Nos shows ao vivo apresentamos algumas que gostamos muito. Quanto ao processo de composição não há regra fixa. Algumas começam a partir de um Riff, outras pela harmonia e outras pela letra.

2112. Como foi feita a seleção das músicas a serem gravadas? Foi na base do sorteio?

Daniel Kid R. Elas se escolheram por si só... pensamos nas que estavam mais amadurecidas nas execuções ao vivo e na recepção positiva do público.

Daniel Gerber. A seleção foi feita mesmo nos shows à medida que íamos tocando e também pela sequência (que eu mencionei acima) do conjunto da obra. Procuramos um equilíbrio em termos de ritmo, letras (conteúdo) e estilos, criando uma sequência que seja natural e não sature em nenhum ponto.

2112. Já ouvi muitas pessoas dizerem que o blues perde muito da sua essência quando gravado em estúdio justamente por ser um estilo musical que sempre atinge o seu ápice ao vivo nas longas jams. Isso é real?

Daniel Gerber. Em parte sim. Mas o Blues, talvez pela origem africana, tem uma “batida” hipnótica - esta combinando bateria, cbx e base - isto eu presenciei em shows de grandes mestres como B.B. King, Magic Slim, Albert Collins, Albert King, Buddy Guy e vários outros, ao mesmo tempo o Blues rock tem a mágica da guitarra, vi um bom número de shows, de guitarristas de Blues e Blues-Rock, e embora ao vivo chega-se a um ponto realmente mágico, após tocar uma música ao vivo muitas vezes, conseguimos sintetizar e captar o melhor dela, aí vem a capacidade de condensar e gravar para passar essência de cada tema. Preparar música para ser gravada em estúdio merece uma compreensão da estrutura e do que gera o feeling. O conceito é um pouco diferente, tem que ter dedicação. 

2112. Muito bacana da parte de vocês citarem Made In Brazil, Os Mutantes, Rita Lee & Tutti Frutti... como influências diretas no som da banda quando a maioria citam apenas bandas gringas. O que mais vocês ouvem?

Daniel Kid R. Eu ouço de tudo um pouco realmente, dou preferências pra produções setentistas. Prefiro não citar nomes, mas ouço muita coisa mesmo!

Daniel Gerber. Bom, deixaria de ser uma entrevista e passaria a enciclopédia musical ..... rss

Paula Mota. O que eu mais ouço é rock setentista como Grand Funk, Free, Humble Pie entre outros e muitas bandas brasileiras como Tomada, Baranga, Pedra, Golpe de Estado, Carro Bomba e por aí vai....

2112. Quais os projetos de vocês para este ano? Teremos o lançamento de um álbum ou um EP?

Daniel Gerber. Iniciamos por gravar e lançar o vídeo clipe de “Mentes Criminosas”, a música também será lançada em plataformas digitais etc. Partimos a partir de abril para a turnê de lançamento do CD, apresentando a obra conjunta e já algumas novas que começam a fazer sua estréia ao vivo. O CD físico completo vai ser lançado durante o ano.

2112. ... o microfone é de vocês!

Daniel Gerber. No ano passado, o Brasil foi o 2º maior em número de downloads de rock no mundo da Spotify , mais de 34 milhões (fonte: Paulinho Heavy-progarma É-noize), temos um público incrivelmente vasto, só que não conseguimos organizar em termos de sobrevivência dos músicos e produções dignas para as bandas (e artistas em geral, claro), então, ao invés de lamentar estamos muito entusiasmados para compor, tocar e divulgar rock tupiniquim de primeira. E vamos em frente!

Dedico esta entrevista ao mestre da batera: Franklin Paolillo 

Fotos: Lincoln Baraccat

Próxima entrevista: Clementines, dia 22


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