Já falei isso várias
vezes, mas vou tornar a repetir: o melhor de trabalhar no 2112 é poder
entrevistar (ainda que por e-mail!) pessoas que você curte e que muitas vezes te
inspirou a várias e várias viagens sonoras. Por isso afirmo que foi uma honra muito
grande entrevistar este que é um dos melhores guitarristas do mundo. Um músico
que nunca se prendeu a rótulos ou estilos… pois tudo que ele queria era ser
livre para tocar música. Leiam a entrevista para entender o porque de Robertinho
ser tão admirado por todos que o conhecem. E viva a democracia musical!
2112. Primeiramente
devo dizer que é uma grande honra entrevistar e postar no 2112 este papo com um
dos maiores guitarristas do mundo... Soube que com doze anos você já era um
exímio guitarrista e que inclusive tocava com os pés. Conte um pouco do início
de sua carreira!
Robertinho do
Recife. Começei a tocar em 1962 aos
11 anos de idade, depois de ter sido atropelado por um carro, fiquei quase um
ano de cama e assistindo os Beatles na tv. Fiquei alucinado pelo som da
guitarra do George Harrison, daí pedi ao meu pai que junto com meu avô Raul me
compraram uma guitarra. Tocava na minha escola com amigos do bairro e entramos
num festival chamado “Primeiro Festival de Músicos Jovens do Nordeste”, então
meu pai me deu a sugestão de tocar com os pés que realmemte foi importante para
levarmos o prêmio de melhor banda kkkkk.
2112. Você já conhecia Hendrix?
Robertinho do
Recife. Hendrix, vim conhecer o som
dele em 1970, quando um amigo tinha trazido um disco dele da América e quando
ele me mostrou eu fiquei louco, definitivamente a guitarra se tornou outro
instrumento para mim.
2112. Neste
período quem era seus ídolos?
Robertinho do
Recife. George Harrison, The
Ventures, Gato dos Jet Blacks, Risonho dos Incríveis.
2112. Você
foi aluno de um seminário e lá aprendeu música sacra, certo? Esse tipo de
música influenciou você como músico e compositor?
Robertinho do
Recife. Sim, eu descobri que
gostava mais da obra sacra dos grandes compositores clássicos como Bach, Mendelssohn,
Beethoven e outros. Compus aos 15 anos de idade uma música chamada ‘’A
brilhante Estrela da Manhã” com versos do livro do Apocalipse.
Fui seminarista estudante de teologia e estudei filosofia e religiões
orientais, assim como a música oriental, principalmente a Indiana. Sei tocar
Sitar Indiana e tenho um profundo conhecimento das fusões que artistas como Maravishnu
John Mclaughlin, Alice Coltrane e outros que fizeram com a música do oriente/ocidente.
2112. Como
o rock entrou em sua vida?
Robertinho do
Recife. Pela guitarra kkk, sabe o
que é Recife? Pedra! Rock em Inglês, kkkk
2112. Já
no final dos anos 60 você estava enturmado com várias pessoas da Jovem Guarda
como Rosemary e Jerry Adriani. Como surgiu estes
contatos?
Robertinho do
Recife. Eu tocava na Tv Jornal do Comécio
em Recife acompanhando cantores e cantoras, esses artistas quando se
apresentavam não levavam banda, nós é que tocavamos com eles.
2112. O
cenário daquela época era muito concorrido?
Robertinho do
Recife. Não, a nossa maior
concorrência eram as dificuldades de estarmos iniciando um movimento de fazer
música em Recife, no tempo ser músico era tocar ou na orquestra sinfônica,
orquestra de frêvo ou tocar em puteiro e eu toquei aí muitas vezes kkk.
2112. Conte
um pouco da sua experiência tocando nos EUA. Com quem você tocou lá?
Robertinho do
Recife. Tocando um dia no Teatro
Santa Isabel com um projeto de música psicodélica chamado LSE (Laboratório de
Sons Estranhos), um grupo de americanos assistiram e me levaram para os Estados
Unidos para fazer um teste lá. Daí lá tive a oportunidade de tocar com o
Watchpocket, uma banda de Memphis que fazia muito sucesso com a música “Mammy
Blue”. Conheci Steve Cropper um grande produtor que era o nosso produtor e também
do Jeff Beck, Booker T. Blues Brothers e outros, BB.King, Bob Rush e muitos artistas do sul dos
Estados Unidos.
2112. Deu para assistir muitos shows bacanas por lá?
Robertinho do
Recife. Os shows que não me saem
jamais da memória foram os do Allman Brothers, Yes formação original com Rick
Wakeman nos teclados, Humble Pie com Peter Frampton na guitarra, James Gang, BB
King assisti 10 shows no backstage com a banda.
2112. Sempre
digo em conversas que um músico não deve se prender a apenas um ritmo... mas
que deve ouvir vários sons para criar um estilo próprio. Você
concorda?
Robertinho do
Recife. Tem guitarristas que estão
na música por causa do Metal outros por outros estilos, outros ainda por outros
motivos como um ídolo por exemplo. Eu estou por causa da guitarra daí onde ela
estiver e o som está me chamando, para mim está bom, acho esse lance de estilos
uma coisa que me lembra partidos políticos, uma turma, uma filosofia, uma estética,
uma comissão julgadora com gente chata demais, esses fundamentalistas são a
pior ditadura para a arte, que deve ter livre expressão.
2112. Os
nordestinos foram os que melhores entenderam essa mensagem ao misturar a música
regional com Elvis, Chuck Berry, música sacra, clássica... o que gerou uma
música que ainda influencia gerações inteiras caso do Raul Seixas, Alceu
Valença, Zé Ramalho, Heraldo do Monte, você entre outros. O que você tem a
dizer sobre isso?
Robertinho do
Recife. Bem, você só cita
nordestinos mas, tem muitos na música brasileira que tiveram um papel muito
importante nessa atualização sonora como gosto de chamar, pois continuamos a
usar os elementos da tradição liquidificado com as informações e tecnologias da
atualidade.
2112. Afirmo
isso levando em conta que a maioria das bandas do Rio e de São Paulo os maiores
redutos do rock neste período seguiam à risca seus ídolos ao invés de arriscar
um caminho próprio. Apenas Os Mutantes, os Tropicalistas e uma minoria tentavam
criar uma sonoridade rock brasileiro o que levou muitos ao ostracismo por
longos anos mas que redescobertos pela nova juventude sedenta por novidades.
Você concorda?
Robertinho do
Recife. Não podemos ser injustos e
negligenciar que as bandas de rock da epóca produziram grandes nomes da MPB
como Lulu Santos, Lobão, Ritchie.
2112. Em
1982 você alcança grande sucesso com a música O Elefante junto a Emilinha.
Conte um pouco sobre esse disco e o sucesso com a criançada!
Robertinho do
Recife. O Elefante realmente
foi a primeira música infantil gravada na época, antes tínhamos apenas o
palhaço Carequinha em vinil 78 rotações.
O letrista da música é o Fausto Nilo que depois de uma longa conversa nossa
sobre elefantes, veio com essa idéia, quando fizemos essa música não tinhamos
noção que faria sucesso com as crianças pois a letra é muito complexa.
2112. Depois
de tocar com tanta gente como Jane Duboc, Cauby Peixoto, The Fevers, Luiz
Melodia, Fagner, Wagner Tiso, Luiz Caldas, Hermeto Pascoal... além do mega
sucesso O Elefante você investe no metal criando a banda Metalmania. O início
foi difícil ser aceito entre os roqueiros mais
radicais?
Robertinho do
Recife. Ainda sou rejeitado pelos
radicais, a questão é que não faço o que eles gostam e sim o que eu gosto, I’m
Sorry About That!
2112. E o
público como reagia nos shows?
Robertinho do
Recife. A metalmania na
época gozava do prestigio de ser uma das pioneiras e a única banda de Metal que
aparecia na TV Globo em programas populares como Chacrinha que inclusive fez um
programa especial para nós chamado “a noite dos Metaleiros”, tocamos fogo no
palco para o pânico da produção da Tv kkk.
2112. A
Metalmania abriu para vários nomes de peso na época como o Quiet Riot que
estava no auge com seu hard metal. Essas apresentações abriu portas para a banda?
Robertinho do
Recife. Sim, ainda hoje tem pessoas
que dizem que foi o primeiro show de metal da vida deles e consideram que nosso
show foi o melhor da noite. Abrimos depois para o “Deep Purple” no
Maracanãzinho.
2112. Vocês lançaram
apenas um disco em 1985 e que hoje é visto como um clássico do estilo. Na época
como foram as vendagens?
Robertinho do
Recife. Por ser um disco de Metal
um estilo que não tinha uma vendagem
expressiva no tempo, a nossa vendagem foi boa, mas, não havia interesse da gravadora
RCA para eu continuar gravando metal pois, na música infantil eu tinha vendido
quase um milhão de discos, kkk.
2112. Já
em 1988 você funda o grupo Yahoo que gravou entre material próprio covers de
Love Bites (Mordida de Amor) do Def Leppard e Angel (Anjo) do Aerosmith com boa
aceitação. Porque você optou pelo do fim do Metalmania e a criação de um grupo
com uma orientação mais pop? A mutação sonora te atrai?
Robertinho do
Recife. Foi a pressão da gravadora
que me cobrava vendas e sucesso na rádio. O Yahoo foi a minha resposta a isso,
ficamos 6 meses em primeiro lugar na parada de sucesso, tivemos temas de 3
novelas da Globo. Podem criticar mas, até os caras do Def Leppard agradeceram a
mim ter feito eles serem conhecidos aqui, inclusive o Phil Colen qundo ouviu o
meu solo falou “waw! it’s better than my solo”.
2112. Depois
do sucesso você largou a música por um tempo e passou a trabalhar apenas como
produtor. O que te estimulou a toma essa decisão?
Robertinho do
Recife. Isso foi depois do disco
Rapsódia Rock e do show com George Martin na Quinta da Boa- Vista com a Orquestra
Sinfônica Brasileira. Fui para Londres e decidi seguir os passos do mestre Martin de ser
apenas produtor que já algum tempo me dedicava a essa função para artistas como
Fagner, Elba , Zé Ramalho.
2112. Você
como músico participou de shows e gravações com gente importantes como George
Martin, Stanley Clark, Peter Tosh, Andy Summer, John Lee Hooker, Deep Purple,
Taj Mahal, Dr. John, Simon Kirke (Free), Steve Cropper entre outros. O que isso
representou para você como músico e mesmo
fã?
Robertinho do
Recife. Alguns desses nomes
estavam em um festival que participei o Jubilee Jam em Jackson Mississippi, o
Andy Summers, Copperland e o Stanley Clarke foi para um especial da tv japonesa
numa formação do The Police depois da saída do Sting. O Simon Kirke do Free, depois
da morte do Paul Kossoff , tocamos muito juntos.
2112. Em
especial como foi trabalhar com George Martin, lendário produtor dos Beatles?
Como ele é fora do holofotes? Vocês conversaram sobre a banda?
Robertinho do
Recife. O Master era uma pessoa humilde
e de uma energia divina, aprendi muito com ele em conversas longas que tivemos em
Londres e aqui no Brasil, ele me tratava com um carinho e admiração que me deram
muita força na minha carreira. Cheguei em Londres um dia depois da gravação de
“Free as a Bird” e tive a honra de ser o primeiro humano no mundo a ouvir a
gravação dessa música kkkk.
2112. Existe
uma informação que você dispensou um convite para participar do lendário grupo
Chicago. O que fato aconteceu?
Robertinho do
Recife. Eu tinha parado de tocar
estava em Recife depois da morte me meu filho Abel, foi quando o Laudir de
Oliveira percussionista da banda me convidou para fazer uma audition (teste),
mas, eu estava em pedaços e sem condições emocionais nenhuma para assumir essa
responsabilidade.
2112. Hoje
você olhando para traz o que faria e o que você não faria?
Robertinho do
Recife. Fiz o
melhor que pude, sempre estamos diante das condições do “Possível e do
Desejado”, nem sempre é possível o que desejamos e vice-versa, portanto, não me
arrependo e sempre respeitarei essas condições.
2112. O
cenário musical atual te empolga? O que você destacaria de interessante?
Robertinho do
Recife. Não me empolga, a internet
é uma fabrica de gente lançado videos sem teor, só técnica, mas, tem gente boa
também, por isso não vou aqui destacar nada para não esquecer de ninguém.
2112. O
que você sente falta nesta nova geração de músicos?
Robertinho do
Recife. Acho um problema essa coisa
de muita técnica e pouca música, muita gente tocando muito bem seus
instrumentos mas, sem saber interpretar uma melodia simples como Parabéns prá Você
kkk, tem poucos que estão dando atenção a isso.
2112. Ultimamente temos perdido excelentes músicos do
calibre de Johnny Winter, John Lee Hooker, Joe Cocker, Belchior, B.B.King entre
outros que foram influências fundamentais para o nascimento de ótimos cantores,
músicos, bandas e que não vemos nos dias de hoje. O que você tem a dizer sobre
isso?
Robertinho do Recife. É o curso da vida, amigo, portanto, apoie o artista
que você gosta, talvez amanhã, ele não esteja mais aqui. Esses artistas que você
citou são de um
2112. Algum
recado para os músicos que estão começando agora?
Robertinho do
Recife. Tenha amor pelo que faz e
não espere nada em troca disso e tudo será ganho!
2112. Agradeço
a sua boa vontade em responder a todas as perguntas e dizer que o microfone é
seu...
Robertinho do
Recife. Obrigado a oportunidade de
falar com vocês, sucesso e um abraço forte em todos!