quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Entrevista Mônica Paz

 

2112. Explique como uma técnica em enfermagem e farmácia entrou numa banda de metal?

Mônica. Lavando louça entre 9 a 11 anos de idade, não lembro a idade exata, queria escutar música para fazer essa obrigação. Encontrei ali na cozinha debaixo do armário uma caixa com uma fita 7 que estava escrito ...And Justice for All e do outro lado Slayer. Foi ali que tudo começou.

2112. O que isso mudou na sua vida?

Mônica. Mudou tudo em relação a música. Eu que só escutava Trem da Alegria, Xuxa, alguns boleros e Raul Seixas porque a minha mãe gostava. Tive uma alta sensibilidade para os rifs de guitarra, a verocidade de voz etc que me faziam transcender em curiosidades .. como é que eles fazem isso??? Quero saber!!!!! 

2112. ... você ouve outros tipos de som além do metal?

Mônica. Sim, gosto da musicalização antiga, desde ópera, bossa nova, clássica, blues, reggae, gosto de contexto e letras poéticas por isso me fascino por antiguidade musical.

2112. Você poderia falar sobre as bandas que participou na adolescência antes de entrar na Kranius?

Mônica. Tive bandas de garagem como que só tocavam em aniversários de amigos, reunião de adolescentes, apresentação em colégio e tudo mais desse gênero. Eu tocava guitarra e cantava também. Geralmente era Ramones músicas de 3 acordes pra conseguir cantar e tocar.. os nomes eram engraçados... porque era o povo de colégio e eu sempre era convidada pra somar na banda então não opinei nos nomes kkkk Narinas Dormentes e Dark Fears.

2112. Existe material gravado dessa época?

Mônica. Nessa época não existia celulares com tanta tecnologia como hoje. Se existir eu não tenho, talvez alguém dessa remota época tenha revelado e sabe Deus onde se encontram.

2112. Falando da Kranius e Solymon. Como essas bandas surgiram?

Mônica. A Kranius começou como brincadeira pra divertir e sair um pouco da rotina pra tocar clássicos de bandas de peso. Mas não sabíamos que ia ter uma repercussão boa... ou seja nada foi planejado, foi acontecendo e quando vimos surgiam muitos convites pra tocar. Já a Solymon foi pensanda com muito carinho por mim e o guitarrista Renato Brandão professor da UFAM a qual queríamos trazer a cultura da Amazônia e suas histórias pra lembrarmos o quanto nossa região é cheia de mistérios e historicamente falando muito pouco abordada pelo povo brasileiro. E muitas das letras a qual eu escrevo são viagens mediúnicas como se eu tivesse ali na hora vendo tudo que aconteceu. 

2112. A sua agenda é bem agitada... além do trabalho, você estuda, participa de duas bandas (isso inclui ensaios, shows e gravações), cuida de casa etc. Como você ministra tudo isso e ainda encontra tempo para você? 

Mônica. No momento estou mais em casa, porquw meu contrato acabou recentemente na empresa a qual prestava serviço, então estou mais em casa estudando pra faculdade de farmácia, para concursos, cuido dos meus filhos, os trabalhos domésticos e uma vez na semana ensaiamos com a Kranius e Solymon. O legal é que são os mesmos músicos para as duas bandas. Quanto a agenda de shows o próximo pro enquanto tá pra outubro no Festival Polirock, e pra final do ano com a 2 edição do Festival Brother's Of Metal.  

2112. Sabemos o quanto o cenário do metal nacional é carente quanto a participação de mulheres cantoras/instrumentistas em bandas. A situação deu uma melhorada mais ainda tem muito a se fazer, não é?

Mônica. Sim, muito a se fazer pois as maioria das mulheres só se limitam aos que os outros querem, ao que se vende, ao que é o gosto do populacho. Umas tem um talento imenso mas se restringe ao que as gravadoras impõem. Já outras mesmo gostam do famoso rock confete (a mesmice). Enfim... É assunto que tem muita pauta pra falar rsrs.

2112. ... você já se sentiu diminuída em algum momento?

Mônica. Diminuída nunca! A palavra certa é decepcionada com atitudes que em pleno século 21 não deveria existir mais. Me sinto é desafiada a mostrar que mulher não se resume a rebolados e músicas chulas, mulher tem cérebro e atitude e se quiser botar tudo isso pra fora em forma de arte e pensamentos pode e deve.

2112. Achei muito interessante e ousado o trabalho que vocês desenvolvem com a Solymon utilizando as crenças, os rituais e o folclore amazônico. Vocês já gravaram algum material?

Mônica. Estamos produzindo e breve gravaremos um EP. Brevemente já estará tudo em mãos se Deus assim o permitir.

2112. O nome da banda foi uma sugestão de Renato Brandão, professor de música da universidade UFAM. Como aconteceu esse episódio?

Mônica. Sim o nome foi ele que deu. Diante de todo o contexto que envolve o estilo ao qual nós queríamos ter uma banda, mais explosão, som pesado e atitude mais brutal, ele foi buscar nas histórias que envolvem nosso Amazonas algo que pudesse traduzir essas qualidades. Lembrou da própria resolução nas crônicas dos primeiros viajantes pela região que contavam sobre um rio que era perigoso, seus habitantes humanos usavam um tipo de curar e veneno denominado sorimun. Mais tarde a palavra se moldando ao português, viria a ser o nome do rio dos venenos, Solimões. Para não ficar tão evidente, então ele pensou em Solymon, um nome curto e forte.

2112. Mônica, como é a cena metálica aí em Manaus? Tem muitos lugares para vocês tocarem? E o público agita bastante?

Mônica. Atualmente só o Condadobar e casas undergrounds que abrem espaço para este tipo de som mais evidente e pesado. Aqui em relação a outras cidades brasileiras como SP o público é não é muito extenso apesar de ter sim seus conhecedores e simpatizantes. Mas não supre a carência do Metal aqui. E sim, o público agita bastante quando são verdadeiros apreciadores da arte que estão escutando. Pois sempre há os curiosos de shows que vão e nem sabem o que tá acontecendo no palco ou o som proposto.

2112. Eu trabalho com o blog a sete anos e vejo que o brasileiro não valoriza como deveria a sua cultura. Qual a sua opinião acerca disso?

Mônica. O populacho brasileiro não dá valor só a sua cultura, mas a educação, aos valores e quase nada de outros assuntos de importância, para que nosso país saia do patamar de pais onde não há leis, não há regras e tudo se pode. Ou seja é uma bagunça. A solução é uma educação de excelência só assim teríamos noção de uma verdadeira cultura raciocinada.

2112. Tenho visto músicos vendendo seus próprios instrumentos de trabalho para sanar dívidas. Como é manter uma banda em meio a toda essa tempestade que é a falta de apoio dos órgãos públicos?

Mônica. Tem que gostar muito do que faz pra juntas seus couros de ratos e manter firme o seu propósito de levar teu recado ao mundo. A vida de quem vive de arte em todos os aspectos não é fácil justamente pela falta de interesse dos que poderiam ajudar.

2112. Tem previsão de algum álbum, single ou vídeos para os próximos meses?

Mônica. Nas próximas apresentações já iremos inserir uma música ou outra da Solymon pra gerar justamente mais material.

2112. Qual telefone/e-mail para contactar a Kranius e a Solymon?

Mônica. O meu WhatsApp é 92994094585, no Instagram ou diretamente nos chats: @kraniusrockband. @solymonband.

2112. Obrigado pela entrevista.

Obs.: Todas as fotos usada nessa postagem foram retiradas do perfil da banda Kranius e da própria Mônica Paz.  

domingo, 13 de agosto de 2023

Entrevista Marcius Monteiro


2112. Você nasceu e cresceu no Pará em meio aos violentos conflitos sociais da sua época. O que isso refletiu na sua carreira e o que te levou a decidir ser músico?

Marcius. Minha primeira composição é sobre o assassinato de um deputado comunista em Belém do Pará nos anos 1980. Acredito que o artista deve falar das lutas de sua comunidade, de seu tempo. Quando decidi ser músico profissional, tinha 18 anos, era 1988 e eu já era um desempregado do governo Sarney. A música foi minha primeira atividade profissional. Eu precisava ganhar dinheiro para me sustentar e o violão era a ferramenta que eu tinha.

2112. ... essa vivência com certeza serviu de material para as suas composições, não?

Marcius. Escrevi canções sobre pessoas comuns em situações extraordinárias. Falei de crianças mortas pela polícia, derrubadas de barracos na favela, operários explorados, peões de obra etc. Cada pessoa que conhecemos têm grandes histórias.

2112. Como foi o seu começo como músico? O que foi mais difícil enfrentar até ser respeitado no meio musical?

Marcius. Comecei cantando e tocando violão nos bares de Belém. Era um dinheiro escasso mas que me permitia pagar o aluguel do quarto de  pensão. Ainda hoje a luta por remuneração justa é uma pauta dos músicos, no entanto a falta de representatividade é nosso maior problema. Os advogados têm a OAB, os médicos são protegidos pelos Conselhos de Medicina e os músicos não têm quem os defenda. Testemunhei diversas tentativas de organização da categoria mas, na realidade mesmo, continuamos sem apoio de ninguém.

2112. Muddy Waters, Elmore James e Janis Joplin me conduziram pelas vielas e encruzilhadas do blues e me tornar um adepto do estilo. E você, quando foi que o blues te pegou?

Marcius. Para mim tudo começou quando assisti na TV Manchete o documentário Blues - Pain Created To Heal Pain, de João Moreira Salles, em 1990. A crueza do relato das vidas daquelas pessoas que viviam o Blues a vida inteira, foi o que me explicou o que era o Blues. Desde então me dediquei a pesquisar a história do Blues e fiz desse estilo minha marca pessoal na profissão de músico. O Blues tem poucos fãs comparado com os estilos do momento, mas cada fã de Blues é um embaixador dessa música. Eu também sou.

2112. Além do blues você curte jazz e música brasileira que faz todo o diferencial na sua música. O que você ouve de MPB?

Marcius. Sempre escutei muito rádio, por isso minha formação musical é tudo o que tocava no rádio nos anos 70, 80 e 90. A programação das rádios era diversificada e de muito bom gosto. Em 1986 inaugurou em Belém a Fonoteca Pública Satyro de Melo, com 10.000 discos de vinil. Eu ia lá todos os dias ouvir discos. Conheci muita coisa boa. O Clube da Esquina e os Beatles eram meus heróis. Tive uma fase Bossa Nova, também pesquisei Cartola e Nelson Cavaquinho, quando morei no Rio de Janeiro, em 1995. Gosto muito de artistas da MPB que também navegam pelo rap. Criolo é um dos meus favoritos, junto com Max de Castro e Ed Motta. Chico, Caetano, Gil, Milton, Djavan, Belchior, João Bosco e Tom Jobim são meus mestres. Aldyr Blanc, Vinícius, Fernando Brant são grandes letristas.

2112. Você é de ficar vasculhando plataformas digitais a procura de novidades? O que você tem escutado de interessante?

Marcius. Escuto sempre os clássicos do Blues e do Jazz. Muito Rolling Stones no carro a caminho do trabalho. Moro na periferia, por isso estou sempre em contato com o funk proibidão e rap. Gosto de algumas músicas, mas depois de um tempo parece tudo a mesma coisa: letras sobre álcool, sexo e grifes de luxo.

2112. Pouco ou nada se comenta sobre a cena rock/blues paraense. Quem você destacaria com um trabalho interessante a ser descoberto?

Marcius. Em Belém o Blues tem grandes expoentes. Destaco Vinícius Leite, Val Fonseca e a banda Baixo Reduto.

2112. ... com a descentralização cultural do eixo Rio-São Paulo o país mostrou a sua cara com o advento de diversos eventos. Mas o seu ver o que ainda falta para melhorar?

Marcius. Os festivais de Blues estão trazendo vários artistas americanos para interagirem com blueseiros brasileiros, isso é excelente para nós e abre oportunidades nos bares. O que ainda precisa melhorar é o valor pago aos músicos na noite. Os proprietários de bares e casas de show têm que subir os cachês, defasados desde antes da pandemia.

2112. Você já tocou em diversas casas noturnas brasileiras e de países como Nova York, Paris e Londres. O que mais te emociona no palco?

Marcius. Minha maior alegria quando estou cantando é ver a alegria no rosto das pessoas. Para mim esse é o papel do artista, levar as pessoas para esse lugar de felicidade.

2112. O que te levou a mudar para Brasília?

Marcius. Vim a Brasília apenas para organizar documentos e viajar para Paris em 1995. Durante esse processo fiz alguns shows na cidade e fui ficando. Desisti de Paris e adotei Brasília. Estou aqui desde então.

2112. Em 2021 você realiza o do sonho de todo músico que é gravar um álbum com suas próprias composições. O que isso representou para você?

Marcius. Gravar minhas composições em um estúdio profissional foi subir um degrau na minha carreira. A participação do guitarrista Toninho Horta foi uma benção e um presente. Já somos amigos a muitos anos e essa parceria estava guardada para esse momento especial.

2112. É comum entre vocês músicos testarem as músicas nos shows para depois gravá-las. Como é transpor toda a espontaneidade dos palcos para o estúdio?

Marcius. O grande desafio no palco é fazer as pessoas "entrarem" na música e passar a mensagem da letra. No estúdio o objetivo é a perfeição da execução da música. Juntar a sensibilidade artística com a perfeição técnica.

2112. Foi você mesmo quem fez os arranjos e produziu?  

Marcius. Os arranjos foram coletivos, cada músico contribuiu. A produção ficou a cargo de Gustavo Halfeld.

2112. ... como surgiu a participação do mestre Toninho Horta? Ele parece ser bem tranquilo, não?

Marcius. Toninho Horta é um amigo de longa data, acompanho sua carreira desde os anos 80 e essa parceria estava guardada para quando eu fosse gravar pela primeira vez. Quando surgiu a oportunidade não houve dúvidas, trouxe Toninho para Brasília e foi uma experiência incrível. Aprendi muito com ele no estúdio.

2112. O que mais te marcou durante as gravações do album?

Marcius. Tudo foi uma grande experiência de descoberta durante a gravação do EP. O que mais me impressionou foi o trabalho mágico do produtor Gustavo Halfeld, ele organizou os instrumentos na gravação e fez as músicas "grandes".

2112. Falando como músico, produtor... o que mais prejudica uma banda hoje em estúdio e que conselhos você daria a quem pensa em gravar? 

Marcius. Antes de entrar em um estúdio de gravação é preciso ter certeza dos arranjos e confiar no produtor. Música é um meio de comunicação e o produtor vai ajudar o artista a passar a mensagem da letra da melhor forma.

2112. Lembro que a alguns anos atrás um músico/banda amargava por anos a fio na estrada até pôr os pés num estudio ao contrário de hoje que existe toda uma urgência em gravar. Qual a sua opinião acerca disso?

Marcius. Gravar uma música ficou mais acessível. Hoje é possível gravar um álbum em casa e lançar no Spotify. Isso é muito positivo. Por outro lado está se formando uma geração de músicos que não fazem muitos shows e têm pouco contato real com o público. Ainda assim o rock e o rap estão criando grandes festivais de música.

2112. Além de músico e produtor você também trabalha como DJ. Você vive apenas da música?

Marcius. Atualmente cantar e tocar guitarra é minha única ocupação. Parei de dar aula de guitarra a muitos anos. Agora tenho mais tempo para tocar na noite e em festivais de Blues.

2112. Há projeto de um novo álbum para este ano?

Marcius. Ainda nesse ano vou lançar duas músicas com produção do Rafael Siqueira nos estúdios Casa Cajá e Sala Funarte. Serão duas canções de minha autoria que falam de emprego e fome.

2112. Qual o e-mail para contratar seus shows?

Marcius. Meu e-mail é marciuscabral@gmail.com. Também estou no Spotify, Deezer, Instagram e todas as plataformas.

2112. ... o microfone é seu!

Marcius. Cada artista tem que refletir o seu tempo. Nas periferias e sertões as pessoas estão vivendo vidas incríveis e precisamos contar as histórias e anseios do nosso povo. Ser artista é abraçar uma missão.

Obs.: Todas as fotos foram copiadas do perfil do músico. Qualquer problemas sobre autoria das mesmas basta entrar em contato pelo e-mail retamero2112@gmail.com que eu faço as devidas correções.